É considerado crime de ação penal pública condicionada à representação do ofendido?

No processo penal temos algumas espécies de ação penal, são elas: 

  • ação penal pública incondicionada à representação
  • ação penal pública condicionada à representação
  • ação penal privada exclusiva
  • ação penal privada personalíssima
  • ação penal privada subsidiária da pública

Nesse texto, contudo, iremos tratar apenas da ação penal pública incondicionada à representação. Mas, afinal, o que é isso?

Diferença entre representação e noticiar o crime (notitia criminis)

Inicialmente, cumpre esclarecer essa diferença para um melhor entendimento do texto.

Popularmente, é falado que tal pessoa foi à delegacia e denunciou outra. Para o Direito, essa expressão está empregada da forma errada. Explico.

Quando vamos à delegacia ou procuramos a Polícia Militar porque fomos vítima de um crime, ou ficamos sabendo de um, estamos tão somente noticiando aquele fato a uma Autoridade Policial. O órgão competente para denunciar é apenas o Ministério Público.

Quando representamos contra alguém significa dizer que você tem interesse em punir o autor do crime e, nesse caso, somente a vítima ou o responsável legal podem fazer. É o que acontece nas ações penais privadas.

Isso posto, seguimos adiante para esclarecer do que se trata a ação penal pública incondicionada à representação.

O que é ação penal pública incondicionada?

O termo “incondicionada à representação” significa dizer que, mesmo que a vítima ou seu representante legal não leve ao conhecimento da Autoridade Policial a ocorrência do crime cometido contra ela, ou não queira que o agente seja punido, o Ministério Público tem o dever de investigar e, se for o caso, oferecer denúncia contra o agente.

Quais são os crimes de ação penal pública incondicionada?

Isso ocorre nos casos de crimes de ação penal pública incondicionada, considerados graves como, por exemplo:

  • Homicídio;
  • violência doméstica;
  • estupro;
  • roubo;
  • furto;
  • estelionato;
  • entre outros.

Há outros casos, inclusive, em que não existe uma vítima pessoa física, mas, sim, o Estado, como:

  • O tráfico de drogas;
  • crimes da administração pública (sonegar imposto, desvio de verba, etc.).

E, porque esses crimes?

O Direito Penal impõe que são crimes graves e podem gerar temor nas vítimas, fazendo com que elas não procurem pela Autoridade Policial e deixem o agente impune.

Ocorre que, nem todos os crimes cometidos chegam ao conhecimento das autoridades naturalmente, seja pela própria vítima, seja pela comoção social causada (onde qualquer cidadão noticia aquele fato), ou por veículos de comunicação (às vezes por filmagem, postagem em rede social, etc.). Nesses casos, de fato não há como haver nenhum inquérito, tampouco denúncia contra o agente infrator.

Instauração do inquérito

Agora, supondo que a vítima ou outra pessoa que tomou conhecimento do crime cometido se dirija a uma delegacia e relate o ocorrido, por exemplo, ao delegado (noticiar o crime), a partir desse momento, ele será obrigado a instaurar um inquérito e proceder com todas as diligências cabíveis ao caso a fim de apurar todos os detalhes. Após finalizado, ele deverá encaminhar os autos do inquérito ao Ministério Público para que o Promotor de Justiça responsável analise e, cumprido todos os requisitos necessários, deverá oferecer denúncia.

Note que eu usei a expressão “deverá”, isso porque, mesmo que a vítima não diga expressamente que quer representar contra o indivíduo, a partir do momento em que o crime chega ao conhecimento da autoridade competente, é obrigatório a investigação e, se for o caso, a denúncia para o prosseguimento regular do processo criminal.

Por isso se chama ação penal pública incondicionada à representação: é pública, porque quem faz a denúncia é o Ministério Público, e incondicionada porque não depende de representação da vítima.

Há casos, inclusive, que a vítima não é nem encontrada para ser citada e comparecer à audiência, mas, mesmo assim, o processo corre normalmente e, havendo provas suficientes, o indivíduo é condenado.

Nesse sentido, fica evidente a importância de um advogado para acompanhar todo o curso do processo para um melhor desempenho e buscar uma absolvição.

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Questão criada em 1/9/2020.

Resposta: sim

“1. A Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, alterou o art. 171 do Código Penal para acrescentar o § 5º, segundo o qual as ações penais decorrentes dos crimes de estelionato passaram a ser processadas mediante representação do ofendido, salvo nas hipóteses dos incisos I a IV (quando a vítima for a Administração Pública, direta ou indireta; criança ou adolescente; pessoa com deficiência mental, ou, maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz).”

Acórdão 1259706, 07079479720208070000, Relator: CARLOS PIRES SOARES NETO, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 25/6/2020, publicado no PJe: 3/7/2020.

Acórdãos representativos

Acórdão 1338326, 00062436920168070020, Relator: JESUINO RISSATO, Terceira Turma Criminal, data de julgamento: 6/5/2021, publicado no PJe: 13/5/2021;

Acórdão 1330081, 07115285420198070001, Relator: CRUZ MACEDO, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 25/3/2021, publicado no DJE: 14/5/2021;

Acórdão 1273866, 00048386920188070006, Relator: MARIO MACHADO, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 13/8/2020, publicado no PJe: 24/8/2020;

Acórdão 1273772, 07122306620208070000, Relator: SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, Segunda Turma Criminal, data de julgamento: 13/8/2020, publicado no PJe: 24/8/2020;

Acórdão 1272256, 00022030920188070009, Relator: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, Terceira Turma Criminal, data de julgamento: 6/8/2020, publicado no PJe: 14/8/2020;

Acórdão 1268300, 00020297820198070004, Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, Segunda Turma Criminal, data de julgamento: 23/7/2020, publicado no PJe: 11/8/2020.

Destaques

  • TJDFT

Estelionato – ação penal condicionada à representação – retroatividade da Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime) 

“4. Segundo o STJ, a modificação na ação penal do crime de estelionato, promovida pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), que entrou em vigor no dia 23/01/2020, passando a exigir a representação da vítima no crime de estelionato, não retroage para alcançar processos cuja denúncia já foi oferecida. Portanto, não há que se falar em ausência de justa causa, em razão de a vítima ter manifestado a vontade de renunciar ao prosseguimento da apuração, uma vez que, quando a denúncia foi oferecida (23/04/2019), o crime de estelionato era de ação penal pública incondicionada."

Acórdão 1377484, 07230503820208070003, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, Segunda Turma Criminal, data de julgamento: 7/10/2021, publicado no PJe: 18/10/2021

  • STJ

Estelionato – denúncia oferecida antes da vigência da Lei 13.964/2019 – art. 171, § 5°, do CP – irretroatividade da lei

 “1. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do HC n. 610.201/SP, DJe 8/4/2021, por maioria de votos, pacificou o entendimento de que não retroage o art. 171, § 5º, do CP, às hipóteses de denúncia oferecida antes da vigência da Lei n. 13.964/2019. Trata-se de ato que não pode ser alcançado pela mudança, pois, naquele momento, a norma processual definia a ação penal para o crime de estelionato como pública incondicionada e a nova legislação não exigiu a manifestação da vítima como condição de sua prosseguibilidade. 2. A representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, prescinde de formalidades. Dessa forma, pode ser depreendida do boletim de ocorrência e de declarações prestadas em juízo.” AgRg no REsp 1912568/SP

Pacote Anticrime – art. 171, § 5°, do CP – retroatividade – restrição à fase policial

“1. A Lei 13.964/2019, de 24 de dezembro de 2019, conhecida como "Pacote Anticrime", alterou substancialmente a natureza da ação penal do crime de estelionato (art. 171, § 5º, do Código Penal), sendo, atualmente, processado mediante ação penal pública condicionada à representação do ofendido, salvo se a vítima for: a Administração Pública, direta ou indireta; criança ou adolescente; pessoa com deficiência mental; maior de 70 anos de idade ou incapaz.

2. Observa-se que o novo comando normativo apresenta caráter híbrido, pois, além de incluir a representação do ofendido como condição de procedibilidade para a persecução penal, apresenta potencial extintivo da punibilidade, sendo tal alteração passível de aplicação retroativa por ser mais benéfica ao réu. Contudo, além do silêncio do legislador sobre a aplicação do novo entendimento aos processos em curso, tem-se que seus efeitos não podem atingir o ato jurídico perfeito e acabado (oferecimento da denúncia), de modo que a retroatividade da representação no crime de estelionato deve se restringir à fase policial, não alcançando o processo. Do contrário, estar-se-ia conferindo efeito distinto ao estabelecido na nova regra, transformando-se a representação em condição de prosseguibilidade e não procedibilidade. Doutrina: Manual de Direito Penal: parte especial (arts. 121 ao 361) / Rogério Sanches Cunha - 12. ed. rev., atual. e ampl. - Salvador: Editora JusPODIVM, 2020, p. 413.

3.Ademais, na hipótese, há manifestação da vítima no sentido de ver o acusado processado, não se exigindo para tal efeito, consoante a jurisprudência desta Corte, formalidade para manifestação do ofendido." AgRg na PET no AREsp 1649986/SP

  • STF

Crime de estelionato – retroatividade da lei penal mais benéfica

"2. A expressão “lei penal” contida no art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal é de ser interpretada como gênero, de maneira a abranger tanto leis penais em sentido estrito quanto leis penais processuais que disciplinam o exercício da pretensão punitiva do Estado ou que interferem diretamente no status libertatis do indivíduo.

3. O § 5º do art. 171 do Código Penal, acrescido pela Lei 13.964/2019, ao alterar a natureza da ação penal do crime de estelionato de pública incondicionada para pública condicionada à representação como regra, é norma de conteúdo processual-penal ou híbrido, porque, ao mesmo tempo em que cria condição de procedibilidade para ação penal, modifica o exercício do direito de punir do Estado ao introduzir hipótese de extinção de punibilidade, a saber, a decadência (art. 107, inciso IV, do CP).

4. Essa inovação legislativa, ao obstar a aplicação da sanção penal, é norma penal de caráter mais favorável ao réu e, nos termos do art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal, deve ser aplicada de forma retroativa a atingir tanto investigações criminais quanto ações penais em curso até o trânsito em julgado." AgREGHC-180421/SP

Estelionato – pacote anticrime – irretroatividade nas hipóteses de denúncia já realizada – princípios da segurança jurídica e da legalidade

“2. Em face da natureza mista (penal/processual) da norma prevista no §5º do artigo 171 do Código Penal, sua aplicação retroativa será obrigatória em todas as hipóteses onde ainda não tiver sido oferecida a denúncia pelo Ministério Público, independentemente do momento da prática da infração penal, nos termos do artigo 2º, do Código de Processo Penal, por tratar-se de verdadeira “condição de procedibilidade da ação penal”.

3. Inaplicável a retroatividade do §5º do artigo 171 do Código Penal, às hipóteses onde o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor da Lei 13.964/19; uma vez que, naquele momento a norma processual em vigor definia a ação para o delito de estelionato como pública incondicionada, não exigindo qualquer condição de procedibilidade para a instauração da persecução penal em juízo.

4. A nova legislação não prevê a manifestação da vítima como condição de prosseguibilidade quando já oferecida a denúncia pelo Ministério Público.” HC 187341/SP

Referências

Art. 171, § 5º, do Código penal;

Lei 13.964/2019.

Quais são os crimes de ação penal pública condicionada à representação?

São exemplos de crimes dos quais se requer Ação Penal Pública Condicionada por representação: Perigo de contágio venéreo (art. 130, CP), ameaça (art. 147, CP), violação de correspondência comercial (art. 152, CP), divulgação de segredo (art.

Quais crimes são mediante representação?

E você, leitor, sabe o que é uma representação criminal? ... .
Segundo o presidente, a representação deve ser feita nos casos de injúria racial, ameaça, lesão corporal de natureza leve e estelionato..

Quais são os crimes condicionados?

Crimes condicionados São aqueles que dependem da realização de uma condição para sua configuração. Tal condição pode estar descrita no tipo (interna) ou não (externa). Exemplo: delito de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio.

O que é ação condicionada à representação?

É uma das espécies de ação penal pública, mas exige representação porque há ofensa à vítima em sua intimidade. Para o seu exercício válido, o legislador optou por condicioná-la a um permissivo externado por esta ou seu representante legal, permissivo este tecnicamente denominado de representação.

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