É possível a venda de ascendente a descendente desde que haja anuência dos demais descententes e do cônjuge do vendedor. Mas se não houver prejuízo à legítima, e o negócio não simule doação, a compra e venda deve ser mantida.
Por Emerson Souza Gomes
Anuência dos descendentes
No contrato de compra e venda entre ascendente e descendente, é exigida a anuência de todos os descendentes para a regularidade do negócio. Veja o que diz o art. 497, do Código:
Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.
Código Civil
Anuência do cônjuge
O cônjuge do vendedor também deverá anuir com o negócio, sendo dispensável o seu consentimento somente no caso do regime do casamento ser o da separação obrigatória de bens; é o que prevê o parágrafo único do dispositivo citado:
Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória.
Art. 496, parágrafo único, do Código Civil
Anulação do negócio
A anulabilidade do negócio é a consequência da compra e venda realizada sem o consentimento de descendentes e cônjuge.
Mas é bom destacar que a compra e venda, ainda que realizada sem o consentimento de descendentes e cônjuge, tem plena eficácia até o momento em que seja declarada nula.
O Código Civil não considera a compra e venda entre ascendente e descendente um negócio nulo de pleno direito, mas um negócio anulavel, produzindo assim efeitos jurídicos. – Caso o bem seja vendido a terceiro, em tese, os descendentes teriam direito a serem indenizados e não a anular a compra e venda subsequente.
Prazo para anulação
É de dois anos o prazo para anulação da compra e venda realizada sem o consentimento de descendentes e cônjuge.
O prazo é de decadência, sendo contado da data da realização do ato.
Requisitos para a anulação da compra e venda
De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os requisitos para a anulação da compra e venda realizada sem a anuência de herdeiros são:
(i) a iniciativa da parte interessada;
(ii) a ocorrência do fato jurídico, qual seja, a venda inquinada de inválida;
(iii) a existência de relação de ascendência e descendência entre vendedor e comprador;
(iv) a falta de consentimento de outros descendentes; e
(v) a comprovação de simulação com o objetivo de dissimular doação ou pagamento de preço inferior ao valor de mercado.
Comprovação do negócio simulado
Como visto acima, em sede de STJ, a comprovação do negócio simulado é um requisito para que seja declarada nula a compra e venda sem anuência dos demais descendentes.
Na hipótese de venda direta de ascendente a descendente, a comprovação da simulação é exigida.
No caso de restar comprovado que a venda tenha sido real, e não simulada para mascarar doação, o negócio deve ser mantido.
Para tanto, deve ficar comprovado que o preço foi realmente pago de acordo com o valor de mercado do bem.
Além disso, não poderá a compra e venda acarretar prejuízo para a legítima dos demais herdeiros.
Base legal
Código Civil
Emerson Souza Gomes, advogado especialista em direito empresarial, sócio da Gomes Advogados Associados, email , fone (47) 3444-1335
Jurisprudência
AgInt no REsp 1572768
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL
201503010788
Relator:
MARCO BUZZI
Órgão Julgador
QUARTA TURMA
Data do julgamento:
20210614
Ementa:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL AÇÃO ANULATÓRIA DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO
AO RECLAMO.
INSURGÊNCIA RECURSAL DOS DEMANDADOS.
1. Consoante a jurisprudência pacífica do STJ, os argumentos apresentados em momento posterior à interposição do recurso especial não são passíveis de conhecimento por importar inovação recursal, indevida em virtude da preclusão consumativa. Ademais, o requisito
do prequestionamento é indispensável mesmo em questões de ordem pública, razão pela qual não se conhece da tese referente à decadência alegada pelos agravantes. Precedentes.
2.
A alegação de afronta ao artigo ao artigo 535 do CPC/73 se deu de forma genérica, sem indicação de quais seriam as teses omissas ou
contraditórias, circunstância impeditiva do conhecimento do recurso especial, no ponto, pela deficiência na fundamentação. Aplicação da
Súmula 284 do STF, por analogia.
3. É inadmissível o recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido apto, por si só, a manter a conclusão a que chegou a Corte Estadual (enunciado 283 da Súmula do
STF).
4. No caso, alterar as conclusões da Corte de origem acerca da legitimidade ativa dos recorridos para propositura da ação anulatória exigiria, necessariamente, a reanálise das circunstâncias fático-probatórias, o que é vedado em âmbito de recurso especial,
ante o óbice do enunciado 7 da Súmula deste Tribunal.
5. Conforme já decidido por esta Corte Superior, a alienação de bens de ascendente a descendente, sem o consentimento dos demais, é
ato ju se eurídico anulável,
cujo reconhecimento reclama: (i) a iniciativa da parte interessada; (ii) a ocorrência do fato jurídico, qual seja, a venda inquinada de inválida; (iii) a existência de relação de ascendência e descendência entre vendedor e comprador; (iv) a falta de consentimento de outros descendentes; e (v) a comprovação de simulação com o objetivo de dissimular doação ou pagamento de preço inferior ao valor de mercado. Precedentes. (REsp 1356431/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 08/08/2017, DJe 21/09/2017)
Incidência da Súmula 83/STJ.
6. Agravo interno desprovido. Acórdão:
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de
Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr.
Ministro
Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Marco Buzzi.
Referência Legislativa:
[LEG:FED LEI:010406 ANO:2002
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
ART:00496, LEG:FED SUM:****** ANO:****
***** SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
SUM:000007 SUM:000083]
Veja:
VEJA
Sucessivos:
Processo:
AgInt
no AREsp 1794273
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
202003147978
Relator:
RAUL ARAÚJO
Órgão Julgador
QUARTA TURMA
Data do julgamento:
20210510
Ementa:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. DIREITO DAS SUCESSÕES. COMPRA E VENDA ENTRE ASCENDENTE E DESCENDENTE SEM CONSENTIMENTO DOS DEMAIS HERDEIROS. PRAZO DECADENCIAL DE DOIS ANOS. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO PROVIDO
PARA CONHECER DO AGRAVO E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
1. Agravo interno contra decisão da Presidência que conheceu do agravo para não conhecer do recurso especial, em razão da falta de impugnação específica de fundamento decisório. Reconsideração.
2. A decisão de origem está em consonância com o entendimento desta Corte Superior no sentido de que ocorre a decadência para anulação de venda de descendentes para ascendentes, sem consentimentos dos demais
herdeiros, em dois anos após a conclusão do ato. Precedentes.
3. Agravo interno provido para, reconsiderando a decisão agravada, conhecer do agravo para negar provimento ao recurso especial.
Acórdão:
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Maria
Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator. Licenciado o Sr. Ministro Marco Buzzi (Presidente). Presidiu o
julgamento o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.
Referência Legislativa:
[LEG:FED CFB:****** ANO:1988
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
ART:00105 INC:00001 LET:A LET:C, LEG:FED SUM:****** ANO:****
***** SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA
SUM:000083]
Veja:
VEJA
Sucessivos:
Processo:
AgInt no REsp 1707751
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL
201702867873
Relator:
MOURA RIBEIRO
Órgão Julgador
TERCEIRA TURMA
Data do julgamento:
20200824
Ementa:
CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO INTERPOSTO SOB A
ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO ANULATÓRIA. OCORRÊNCIA DE
INOVAÇÃO RECURSAL NA
APELAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. REEXAME
DE FATOS E PROVAS. INAFASTÁVEL A INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO STJ.
PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DE <mark>VENDA</mark> ENTRE <mark>ASCENDENTE</mark> E <mark>DESCENDENTE.</mark> ART.
496 DO CC/02. NEGÓCIO JURÍDICO ANULÁVEL. TERMO INICIAL, A CONCLUSÃO
DO ATO. PRECEDENTES. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 568 DO STJ. AGRAVO
INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Aplica-se o NCPC a este
recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015(relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma
do novo CPC.
2. A alteração da conclusão do acórdão recorrido, de que a petição
inicial se fundamentou na pretensão anulatória do art. 496 do CC/02
e sem mencionar a prática de simulação ou do
uso de interposta
pessoa, exige reapreciação do acervo fático-probatório da demanda,
o
que faz incidir o óbice da Súmula nº 7 do STJ.
3. A jurisprudência desta eg. Corte Superior já proclamou que a
natureza do vício da <mark>venda</mark> direta de <mark>ascendente</mark> a <mark>descendente</mark> sem o
consentimento dos demais <mark>descendentes</mark> é de hipótese de
anulabilidade
do ato jurídico e não de nulidade de
pleno direito e o prazo para o
exercício da ação anulatória é de 2 (dois) anos, a contar da
conclusão do ato. Precedentes. Incidência da Súmula nº 568 do STJ.
4. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar
a
inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o
presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado
impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios
termos.
5. Agravo interno não
provido.
Acórdão:
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do
voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino,
Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr.
Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro
Moura
Ribeiro.
Referência Legislativa:
[LEG:FED LEI:010406 ANO:2002
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
ART:00179 ART:00496, LEG:FED SUM:****** ANO:****
***** SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
SUM:000007 SUM:000083 SUM:000568]
Veja:
VEJA
Sucessivos:
Processo:
REsp
1679501
RECURSO ESPECIAL
201700646007
Relator:
NANCY ANDRIGHI
Órgão Julgador
TERCEIRA TURMA
Data do julgamento:
20200310
Ementa:
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE
ATOS JURÍDICOS CUMULADA COM CANCELAMENTO DE REGISTRO PÚBLICO. <mark>VENDA</mark>
DE BEM. <mark>ASCENDENTE</mark>
A <mark>DESCENDENTE</mark>. INTERPOSTA PESSOA. NEGÓCIO
JURÍDICO ANULÁVEL. PRAZO DECADENCIAL DE 2 (DOIS) ANOS PARA ANULAR O
ATO.
1. Ação declaratória de nulidade de atos jurídicos cumulada com
cancelamento de registro público, por meio da qual se objetiva a
desconstituição de <mark>venda</mark> realizada entre <mark>ascendente</mark> e <mark>descendente,</mark>
sem
o consentimento dos demais <mark>descendentes,</mark> em nítida inobservância
ao art. 496 do CC/02.
2. Ação ajuizada em 09/02/2006. Recurso especial concluso ao
gabinete em 03/04/2017. Julgamento: CPC/73.
3. O propósito recursal é definir se a <mark>venda</mark> de <mark>ascendente</mark> a
<mark>descendente,</mark> por meio de
interposta pessoa, é ato jurídico nulo ou
anulável, bem como se está fulminada pela decadência a pretensão dos
recorridos de desconstituição do referido ato.
4. Nos termos do art. 496 do CC/02, é anulável a <mark>venda</mark> de <mark>ascendente</mark>
a <mark>descendente,</mark> salvo se os outros <mark>descendentes</mark> e o cônjuge do
alienante expressamente houverem
consentido.
5. O STJ, ao interpretar a norma inserta no artigo 496 do CC/02,
perfilhou o entendimento de que a alienação de bens de <mark>ascendente</mark> a
<mark>descendente,</mark> sem o consentimento dos demais, é ato jurídico
anulável, cujo reconhecimento reclama: (i) a iniciativa da parte
interessada; (ii) a ocorrência do fato jurídico,
qual seja, a <mark>venda</mark>
inquinada de inválida; (iii) a existência de relação de ascendência
e descendência entre vendedor e comprador; (iv) a falta de
consentimento de outros <mark>descendentes</mark>; e (v) a comprovação de
simulação com o objetivo de dissimular doação ou pagamento de preço
inferior ao valor de mercado.
Precedentes.
6. Quando ocorrida a <mark>venda</mark> direta, não pairam dúvidas acerca do
prazo para pleitear a desconstituição do ato, pois o CC/02 declara
expressamente a natureza do vício da <mark>venda</mark> – qual seja, o de
anulabilidade (art. 496) -, bem como o prazo decadencial para
providenciar a sua
anulação – 2 (dois) anos, a contar da data da
conclusão do ato (art. 179).
7. Nas hipóteses de <mark>venda</mark> direta de <mark>ascendente</mark> a <mark>descendente,</mark> a
comprovação da simulação é exigida, de forma que, acaso comprovada
que a <mark>venda</mark> tenha sido real, e não simulada para mascarar doação –
isto é, evidenciado que o preço foi realmente pago
pelo <mark>descendente,</mark>
consentâneo com o valor de mercado do bem objeto da <mark>venda,</mark> ou que
não tenha havido prejuízo à legítima dos demais herdeiros -, a mesma
poderá ser mantida.
8. Considerando que a <mark>venda</mark> por interposta pessoa não é outra coisa
que não a tentativa reprovável de contornar-se a exigência da
concordância dos demais
<mark>descendentes</mark> e também do cônjuge, para que
seja hígida a <mark>venda</mark> de <mark>ascendente</mark> a <mark>descendente,</mark> deverá ela receber
o mesmo tratamento conferido à <mark>venda</mark> direta que se faça sem esta
aquiescência. Assim, considerando anulável a <mark>venda,</mark> será igualmente
aplicável o art. 179 do CC/02, que prevê
o prazo decadencial de 2
(dois) anos para a anulação do negócio. Inaplicabilidade dos arts.
167, § 1º, I, e 169 do CC/02.
10. Na espécie, é incontroverso nos autos que a <mark>venda</mark> foi efetivada
em 27/02/2003, ao passo que a presente ação somente foi
protocolizada em 09/02/2006. Imperioso mostra-se, desta feita, o
reconhecimento
da ocorrência de decadência, uma vez que, à data de
ajuizamento da ação, já decorridos mais de 2 (dois) anos da data da
conclusão do negócio.
11. Recurso especial conhecido e provido.
Acórdão:
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos
votos e das notas taquigráficas constantes dos
autos, por
unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial nos
termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de
Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze
e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Referência Legislativa:
[LEG:FED LEI:010406 ANO:2002
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
ART:00167 PAR:00001 INC:00001 ART:00169 ART:00179
ART:00496]
Veja:
VEJA
Sucessivos: