Qual a natureza jurídica do Stay period?

Em 26 de março de 2021 foi sancionada a Lei 14.112 de 2020, a chamada Nova Lei de Recuperação Judicial e Falência. A atualização legislativa foi impulsionada pela crise econômico-financeira ocasionada pela Pandemia de Covid-19 com o intuito de aprimorar, efetivamente, o instituto da recuperação judicial.

A alteração de Lei teve como objetivo primordial superar algumas ineficiências da Lei nº 11.101/2005, acrescentando alguns instrumentos processuais e materiais interessantes ao pleno desenvolvimento da recuperação judicial e a falência da empresa.

Para compreender as alterações trazidas pela Lei 14.112 de 2020, listamos as principais, confira:

– Stay period: Na Lei anterior, se previa que o prazo de suspensão das execuções contra o devedor – chamado de stay period – de 180 dias era improrrogável. Agora existe expressa possibilidade de prorrogação desse prazo, em uma única vez, desde que o devedor não tenha concorrido para a superação do período.

– Prioridade na tramitação: A nova lei prevê que os processos disciplinados pela Lei 11.101/2005, terão prioridade em sua tramitação, exceto o habeas corpus e outras prioridades já estabelecidas em leis especiais. Aqui, podemos visivelmente verificar um grande avanço, vez que tal determinação beneficia tanto os credores como a própria empresa em recuperação ou falência.

– Constatação prévia: Não era incomum que os Juízes, logo após a distribuição do pedido de recuperação judicial, nomeassem um profissional para realizar uma constatação prévia, também conhecida como perícia prévia, a fim de apurar as reais condições de funcionamento da empresa e a regularidade da documentação, que por sua natureza é bastante complexa.

A constatação prévia não era expressamente prevista na lei e gerava uma série de discussões entre os estudiosos e até mesmo na jurisprudência.

Agora, a nova legislação acabou com essa discussão: isto porque há uma previsão expressa para a nomeação de profissional de confiança para realizar a constatação prévia e apresentar laudo no prazo máximo de 5 dias, ou seja, após a distribuição da recuperação judicial o Juiz poderá nomear profissional para verificar se todos os documentos exigidos na lei de recuperação judicial e falências, foram apresentados de forma correta, bem como se os documentos correspondem a real situação da empresa, sem, contudo, adentrar na viabilidade da empresa, ou seja, uma prévia verificação se a atividade empresarial da empresa ocorre de fato como se alega.

– Consolidação processual e substancial: Na prática, a consolidação processual e substancial já era aceita pela jurisprudência majoritária, mas agora tais institutos vêm expressamente regulamentados pela Lei.

A primeira diz respeito à possibilidade de um grupo sob controle societário comum requerer recuperação judicial conjuntamente, com a coordenação de atos processuais, mas mantendo a independência dos devedores, ativos e passivos, evitando o ajuizamento de múltiplos processos de modo a privilegiar a eficiência e a redução dos custos. Neste caso, o plano de recuperação judicial apresentado pode ser independente ou unitário.

Em sentido contrário, na consolidação substancial, não existe independência entre devedores ativos e passivos de cada empresa do grupo, todos são tratados como se pertencessem a um só devedor. Para este caso, o plano de recuperação judicial apresentado deve ser uno para todas as empresas devedoras.

Tal instituto, trata-se de claro e necessário avanço da legislação recuperacional, que, ao considerar os novos critérios para identificação do tratamento dos grupos empresariais em recuperação judicial, conferiu às partes envolvidas no processo maior segurança jurídica, permitindo às empresas que desejam socorrer-se dessa ferramenta um melhor planejamento e possibilidade de êxito em seus requerimentos.

– Plano de recuperação judicial proposto por credores: Antes da alteração legislativa, somente a própria empresa em recuperação poderia apresentar o plano de recuperação judicial. Agora, a Lei prevê a possibilidade de apresentação do plano de recuperação judicial por parte dos credores, nos 30 dias subsequentes à rejeição do plano apresentado pela própria empresa em recuperação, ou caso transcorra o stay period sem que o Plano de Recuperação Judicial da Recuperanda tenha sido aprovado.

– Crime falimentar: Essa alteração é uma das mais polêmicas na lei de recuperação e falência. Isso porque torna explicitado que é crime o “devedor, até a aprovação do plano de recuperação judicial, distribuir lucros ou dividendos a sócios e acionistas, sujeitando-se o infrator ao disposto no art. 168 desta Lei“.

Então, todo o cuidado para se evitar tal tipificação deve ser observado, sob pena de o devedor-recuperando estar enquadrado na “fraude contra credores”.

– Tentativa de conciliação antecedente à recuperação judicial: A Lei 11.101/2005 passa a contar com uma sessão voltada a estimular conciliações e mediações antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial. As sessões podem ocorrer em qualquer tempo e grau de jurisdição e podem implicar na suspensão dos prazos, caso as partes assim concordarem ou houver determinação judicial.

Ainda, passa a prever expressamente, em um rol não exaustivo, a admissibilidade de sessões de conciliação e mediação nas fases pré-processuais e processuais.

Isso importa dizer que existe a possibilidade de a empresa negociar com credores antes ou depois de entrar em recuperação judicial, estimulando, sempre que possível, a conciliação, a mediação e outros métodos alternativos de solução de conflitos relacionados à recuperação judicial e à falência, respeitados os direitos de terceiros.

– Competências do administrador judicial: A lei nova traz uma série de tarefas do administrador judicial. Agora, o artigo confere mais tarefas ao profissional, como estimular a conciliação, mediação e outros métodos alternativos de solução de conflitos); manter endereço eletrônico na internet com informações atualizadas sobre os processos de recuperação judicial e falência, fornecendo consulta às principais peças do processos, salvo se houver decisão judicial em contrário; e manter endereço eletrônico exclusivo para recebimento de habilitações ou divergências administrativas, fornecendo modelos aos credores interessados, salvo decisão judicial em contrário.

– Substituição de deliberações realizadas em assembleia geral de credores: As deliberações que antes deveriam ser realizadas apenas em assembleia geral de credores agora poderão ser substituídas, com os mesmos efeitos, por termo de adesão firmado por tantos credores quantos satisfaçam o quórum de aprovação específico; votação realizada por meio de sistema eletrônico que reproduza as condições de tomada de voto da assembleia-geral de credores; ou qualquer outro mecanismo reputado suficientemente seguro pelo juiz.

– Parcelamento da dívida tributária: Tema conexo com o direito tributário é a previsão de parcelamento fiscal em até 120 vezes e a possibilidade de “liquidação de até 30% da dívida consolidada no parcelamento com a utilização de créditos decorrentes de prejuízo fiscal da base de cálculo da Contribuição social sobre o Lucro Líquido ou com outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.

Nessa hipótese, o restante poderá ser parcelado em até 84 (oitenta e quatro) parcelas, calculadas de modo a observar os percentuais mínimos, aplicados sobre o saldo da dívida consolidada.

– Recuperação Judicial do produtor rural: Por fim, outra grande novidade é o fato do produtor rural ter a possibilidade de requerer a recuperação judicial. A nova Lei, dispõe sobre a possibilidade de este optar pelo plano de recuperação especial similar ao destinado aos microempresários individuais desde que o valor da causa não exceda a R$ 4,8 milhões e que comprove que exerce atividade por no mínimo dois anos, por meio da apresentação da escrituração contábil fiscal (ECF), se pessoa jurídica, pela apresentação de livro caixa digital do produtor rural (LCDPR), ou documento similar.

De forma geral, as alterações foram importantes, sobretudo neste momento de pandemia, modernizando a Lei 11.101/2005, permitindo uma maior efetividade na reestruturação das empresas que estejam passando por dificuldades financeiras, trazendo novas alternativas para a solução das crises (econômica, financeira e patrimonial), além de estimular o desenvolvimento econômico através de novas modalidades de concessão de crédito.

Assim, se a sua empresa está passando por dificuldades é imprescindível buscar ajuda de profissional preparado e com experiência para atuar nesta área, dando todo suporte necessário para a recuperação.

Autora: Andressa Remocri de Lima – Publicado originalmente em GH Advogados

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