TOLEDO, Sabrina. Psicomotricidade e Expressão na educação infantil in FERREIRA, C. A. M. (Org.); HEINSIUS, A. M. (Org.); BARROS, D. R. (Org.). “Psicomotricidade Escolar”. Rio de Janeiro: Wak, 2008. (ISBN 978-85-88081-89-5) Show PSICOMOTRICIDADE E EXPRESSÃO CORPORAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL O presente artigo tem como objetivo ressaltar de que forma o psicomotricista pode usar a Expressão Corporal como uma ferramenta de trabalho em sua prática na Educação Infantil, mais especificamente com crianças de 4 a 6 anos. Para isso utilizamos o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), documento do Ministério de Educação e Cultura de 1998, formado por uma série de orientações pedagógicas que auxiliam na implantação de práticas educativas e criam o ambiente necessário para o exercício da cidadania. O RCNEI amplia o significado do corpo na Educação Infantil e mostra a importância da variação tônica, da motricidade e da expressividade presentes no movimento. Intencionamos, então, mostrar como o psicomotricista está apto para desenvolver todos os objetivos citados no Referencial, e como a Expressão Corporal o auxilia nessa tarefa. Educação Infantil no Sistema Educacional Brasileiro As instituições de Educação Infantil foram incluídas recentemente no sistema
educacional brasileiro. A Constituição Federal de 1988 foi a primeira a inserir, em seu capítulo relativo à educação, as creches e pré-escolas. Desde então, o atendimento educacional às crianças entre zero e seis anos tornou-se, do ponto de vista legal, um dever do Estado e um direito da criança. Com intenção de colocar em prática as leis constitucionais, a nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB), promulgada em dezembro de 1996, afirma na Composição dos Níveis Escolares que a primeira etapa da
educação básica, a Educação Infantil, tem como objetivo o desenvolvimento integral da criança no que diz respeito aos seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, atendendo as crianças de até três anos nas creches e de quatro a seis anos nas pré-escolas. A partir dessas diretrizes, o Ministério da Educação e Desporto passa a incluir a Educação Infantil no sistema educacional público Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) O RCNEI é constituído de três volumes: “Introdução”, “Identidade e Autonomia” e “Conhecimento de Mundo”. No primeiro volume é realizada uma reflexão sobre a Educação Infantil no Brasil e as concepções atuais de criança, educação instituição e educador. É fato de que a maioria das creches no Brasil nasceu da tentativa governamental de assistir às crianças de baixa renda, amenizar sua pobreza e resolver problemas ligados à sobrevivência delas. Houve uma espécie de segregação institucional, pois só os pobres eram atendidos, numa tentativa de atenuar as supostas carências de uma população de baixa renda. Tal pensamento contribuiu em muito para que a Educação Infantil, e principalmente as creches fossem vistas como um lugar de compensação, com características assistencialistas, no qual os cuidados com as crianças se resumiam aos cuidados físicos: alimentar, higienizar e “tomar conta”. Para transformar essa visão reducionista, é preciso assumir as especificidades da Educação Infantil e entende-la como um espaço responsável por promover a integração dos aspectos físicos, afetivos, cognitivos e sociais da criança. As instituições infantis têm como objetivo desenvolver a individualidade e a cidadania de cada criança mediante atividades pedagógicas, brincadeiras e cuidados necessários para o seu bem-estar. Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o desenvolvimento das capacidades de apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, na perspectiva de contribuir para a formação de crianças felizes e saudáveis. (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, 1998) A Educação Infantil passa a ser vista como a parte inicial e fundamental de um amplo processo de educação que tem a sua continuidade nos vários níveis posteriores do ensino fundamental. Movimento O terceiro volume do Referencial diz respeito à experiência de Conhecimento de Mundo e é dividido em seis documentos diferentes: Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Sociedade e Matemática. Neste artigo, abordaremos o documento relativo ao Movimento, intimamente relacionado com a prática da Expressão
Corporal numa abordagem psicomotora. Diferentes Concepções: Há diferentes concepções acerca do movimento na Educação Infantil. Uma visão acredita ser necessário impor rígidas restrições posturais às crianças e suprimir o movimento, pois este é sinônimo de indisciplina. Nesse caso, os alunos costumam aguardar muito tempo em filas, sem
mover-se, ou predomina a realização de atividades sistematizadas, como montar, desenhar, colar, em que qualquer deslocamento é visto como desordem. Segundo essa concepção, o movimento é visto como algo que atrapalha o desenvolvimento – quando sabemos que é justamente o contrário –, e temos como conseqüência a hostilidade ou a passividade da criança. “Do ponto de vista da atividade muscular, os recursos de expressividade correspondem a Para a Psicomotricidade, o tônus não só é o pano de fundo de qualquer ato motor, como também é a trama na qual todas as emoções são tecidas. A vivência de qualquer sentimento está sempre relacionada ao
comportamento tônico do indivíduo. Essa função comunicativa do tônus encontra sua origem na relação mãe-bebê. Isso fica bastante claro nos momentos de prazer e desprazer da criança, ligados à distensão e à tensão respectivamente. O desconforto (ausência da mãe, fome, frio) aparece num corpo tenso, rígido, no qual a hipertonia de apelo se faz visível no bebê, já o conforto (saciedade, satisfação) aparece num corpo calmo, tranqüilo, numa hipotonia de satisfação. Essa relação entre o tônus e a
emoção, que persiste durante toda a vida do ser humano, é um dos grandes objetos de estudo da Psicomotricidade e é sempre levada em conta em qualquer prática psicomotora. O trabalho tônico na Educação Infantil deve ser proposto a partir de uma percepção Histórico da Psicomotricidade Foi em 1909 que o médico psiquiatra Dupré, ao identificar o paralelismo entre as manifestações motoras e psíquicas, usou, pela primeira vez, o termo “psicomotricidade”. O termo, ainda separado por hífen, apareceu para descrever uma nova abordagem médica a qual percebia que certos fenômenos patológicos ultrapassavam o modelo anátomo-clínico, havendo uma estreita relação entre
anomalias psíquicas e motoras. Os pesquisadores dessa área dividiam-se em dois grupos: de um lado havia a corrente neurológica, que investigava os aspectos anatomofuncionais da motricidade e suas relações; do outro, havia a investigação psicológica da realização e significação da motricidade. Segundo a etimologia, a palavra Psicomotricidade é formada por dois termos de raízes Educação Psicomotora A proposta de Movimento feita pelo Referencial é de máxima importância para as escolas de Educação Infantil. Ela aponta para um novo paradigma do movimento e sua expressividade, busca proporcionar experiências às crianças para que elas se tornem indivíduos conscientes, responsáveis e criativos. Consideramos que o profissional apto a realizar esse projeto é o psicomotricista. Quando a Psicomotricidade é usada na prática educativa das escolas, é chamada de Educação Psicomotora. Muitos autores desenvolveram diferentes métodos para a atuação do psicomotricista na educação, entre os quais se destacam: Jean Le Boulch, Pierre Vayer, André Lapierre e Bernard Aucouturier. Todos têm como objetivo atingir a disponibilidade corporal da criança, favorecer seu desenvolvimento psicomotor e propiciar sua integração escolar e social. No presente trabalho, optamos por usar como método psicomotor a Expressão Corporal, desenvolvida pela bailarina e psicomotricista argentina Patricia Stokoe. A Expressão Corporal é usada para diferentes fins, mas possui uso claro e definido na
Educação Infantil como um método de Educação Psicomotora. A Expressão Corporal parte da compreensão dos fenômenos psicomotores e deseja iniciar na criança a busca e a afirmação da sua própria linguagem corporal, o que define a Expressão Corporal como essencialmente psicomotora. Fundamentação Teórica Objetivos da Educação Infantil e do Movimento A Psicomotricidade contribui para todos os objetivos citados no Referencial, tanto os objetivos específicos que o trabalho com o movimento deve ter, quanto os que a Educação Infantil como um todo deve alcançar. Transcrevemos a seguir alguns desses objetivos citados no documento
para desenvolvermos a idéia de que a prática da Expressão Corporal baseada na Educação Psicomotora atua diretamente sobre todos esses objetivos: – “Descobrir e conhecer progressivamente seu próprio corpo, suas potencialidades e seus limites, desenvolvendo hábitos de cuidado com a sua própria saúde e
bem-estar.” Descobrir e conhecer o próprio corpo é o que
nós chamamos de esquema corporal. A etapa do “corpo vivido” corresponde à organização do esquema corporal. A partir desse período, estarão associadas à imagem visual do corpo as sensações táteis e as sensações cinestésicas correspondentes (Le Boulch, 1982). É neste sentido de tornar as sensações mais conscientes que a Psicomotricidade atua, ampliando e aprofundando a noção de esquema corporal das crianças. – “Estabelecer vínculos afetivos e de troca com o outro, ampliando sua possibilidade de comunicação e interação social.” – “Brincar, expressando emoções, sentimentos, pensamentos e desejos e necessidades.” Toda criança, num ambiente favorecedor, exprime seus desejos e fantasmas por meio de um agir simbólico. É por meio das suas brincadeiras que a criança expressa seus sentimentos. É de máxima importância que exista nas escolas um ambiente adequado, como a prática psicomotora, onde ela possa expressar-se e ser auxiliada por um adulto, que tenha atenção para as formas de comunicação não-verbal, como o psicomotricista. O psicomotricista deve atentar para o tipo de atividade criadora que permite à criança a expressão de sua singularidade e a evolução da sua imagem corporal. A Psicomotricidade reconhece o valor do brincar e o incentiva em suas práticas. Foto 3 – Durante a exploração tátil dos tecidos, a criança faz uso deles para expressar sentimentos, idéias e desejos de forma lúdica e prazerosa. – “Utilizar
as diferentes linguagens (corporal, musical, plástica, oral e escrita) de forma a expressar idéias e sentimentos, enriquecendo cada vez mais sua capacidade expressiva.” Foto 5 – As artes plásticas aparecem inseridas no trabalho psicomotor. A psicomotricidade fina é trabalhada ludicamente em atividades como pintar um bicho na mão e mover-se como ele. Na foto a criança pintou um pato. – “Conhecer algumas manifestações culturais, demonstrando atitude de interesse, respeito e participação frente a elas,
valorizando a diversidade.” Foto 6 – A criança imita um saci-pererê fumando cachimbo: a diversidade cultural e o equilíbrio são trabalhados no brincar. – “Ampliar as possibilidades expressivas do próprio movimento.” Foto 7 – Trabalho sensório-motor com os filós: explorando a suavidade dos movimentos corporais. Tônus No Referencial, o tônus é visto como o grande diferencial das concepções existentes sobre o movimento, por ser o responsável pela qualidade dos gestos e pela manutenção da Expressividade e Motricidade Segundo o Referencial, os objetivos do trabalho com o movimento podem ser agrupados em dois blocos: a expressividade e o caráter instrumental do corpo. A expressividade diz respeito ao incentivo da capacidade expressiva corporal e à percepção das sensações, limites e possibilidades do próprio corpo. Já o caráter instrumental do movimento, está relacionado à motricidade e ao desenvolvimento do equilíbrio e da coordenação global da criança por meio de atividades que
desenvolvam as habilidades de força, velocidade, resistência e flexibilidade, e permitam pesquisar as diferentes qualidades de movimento e desenvolver a percepção espaço-temporal. O movimento é compreendido no RCNEI como um eixo de trabalho que deve: Segundo o RCNEI, incentivar as crianças a desenvolver a motricidade e a expressividade dos seus corpos é um dos principais objetivos do profissional na Educação Infantil. Ambos os aspectos são intensamente trabalhados durante uma prática psicomotora. O corpo como instrumento é trabalhado em propostas que envolvem o equilíbrio estático e dinâmico, a coordenação motora global e fina, a
estruturação espaço-temporal. Já a expressividade é incentivada em situações mais lúdicas, menos diretivas, nas quais as crianças podem deixar transparecer seus desejos e receios. (…) o corpo é entendido como uma função, como um instrumento, como esquema corporal , O corpo traz no seu movimento um caráter tanto expressivo quanto instrumental. O papel do psicomotricista na escola é estar sempre atento a esses dois aspectos, considerando o corpo como uma unidade indissociável e proporcionando à criança uma vivência corporal lúdica que beneficie seu desenvolvimento psicomotor. Conclusão A primeira conclusão a que chegamos é que o psicomotricista pode enriquecer a sua prática na escola com o conhecimento e a vivência da Expressão Corporal. Na educação, a Expressão Corporal é
uma atividade especificamente organizada para aprofundar a linguagem corporal e para enriquecer a expressividade das crianças por meio do corpo, além de atuar sobre o esquema corporal, a lateralidade, o equilíbrio, a coordenação motora, a postura, a orientação espaço-temporal e o tônus. A Expressão Corporal é, sem dúvida nenhuma, uma das ferramentas que o psicomotricista possui para atuar nas escolas. Outra conclusão diz respeito à importância que o movimento tem na Educação Infantil, por ser
fundamental para o desenvolvimento harmonioso da criança nas áreas social, cultural, expressiva, cognitiva, motora, afetiva, perceptiva e artística. É preciso que todas as escolas se conscientizem disto. Referências Bibliográficas BRASÍLIA. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental. ANEXOS: Qual o objetivo das expressões corporais?Um dos principais objetivos do trabalho de expressão corporal é desenvolver a percepção, isto é, tornar o indivíduo mais consciente das suas sensações e percepções, tanto das exteroceptivas quanto das proprioceptivas.
Quais os principais benefícios da expressão corporal?- melhora das relações no grupo e da comunicação; - liberação das tensões internas mediante o movimento criativo; - melhora do desenvolvimento sensorial em nível de emoção, de sentimentos, de inquietações, etc.
Qual a importância de expressão corporal na educação física?A expressão corporal carrega as possibilidades de desenvolvimento corporal como um todo, oportunizando esse corpo a expor suas emoções, muitas vezes oprimidas e ignoradas, portanto a expressão corporal e todos seus benefícios podem ser evidenciados no desenvolvimento humano e no processo educacional.
O que a expressão corporal diz?Dessa forma, mais do que o conteúdo em si, a linguagem corporal é responsável por transmitir as emoções e sensações que sentimos naquele momento, utilizando tanto os gestos, a postura do corpo, o tom de voz e a velocidade da nossa fala ou, até mesmo, a forma como andamos enquanto nos comunicamos.
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