Como seria se ela estivesse centrada no papel do professor de acordo com a tendência tradicional?

Par�metros Curriculares Nacionais
e
Autonomia da Escola

Jos� M�rio Pires Azanha
(Conselho Estadual de Educa��o de S�o Paulo
Faculdade de Educa��o da USP)

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I. Os PCN e os Estados e Munic�pios

A parte introdut�ria do texto que apresenta os PCN, ap�s algumas considera��es sobre a suficiente expans�o do ensino fundamental nos �ltimos anos, det�m sua aten��o na qualidade desse ensino, com suas altas taxas de evas�o e repet�ncia, para finalmente concluir que �o modelo educativo que vem orientando a maioria das pr�ticas pedag�gicas n�o atende mais as necessidades apresentadas pelo atual cen�rio s�cio-pol�tico-econ�mico do pa�s�. (1, 1)

Essa conclus�o baseia-se, em parte, nas an�lises feitas no �mbito de um projeto de pesquisa que examinou, sob alguns aspectos, as �propostas curriculares para o ensino de 1o. grau elaboradas pelas Secretarias de Educa��o de 21 estados e do Distrito Federal nos �ltimos 10 anos e, na sua maioria, em vig�ncia nos respectivos sistemas de ensino�. (2, 1)

Em face desse estudo e de outros, concluiu-se que �uma tarefa essencial na busca da melhoria da qualidade do ensino passa a ser a de elaborar par�metros claros no campo curricular, capazes de orientar as a��es educativas nas escolas�. (1, 3)

O quadro � o seguinte: a insufici�ncia e a fragmenta��o das a��es educativas, no �mbito das Unidades Federadas, exigiriam esfor�os que garantissem a generaliza��o �no pa�s, das orienta��es mais atualizadas e condizentes com o avan�o dos conhecimentos no mundo contempor�neo� (1, 4) como condi��o para que alcancemos �padr�es de qualidade� no ensino fundamental.

Como se percebe, os PCN apresentam-se como uma nova reforma do ensino fundamental brasileiro com todas as suas amplas conseq��ncias na forma��o e no aperfei�oamento dos professores, na revis�o de livros did�ticos etc. Em face da relev�ncia social da iniciativa, conv�m que examinemos alguns dos argumentos adiantados como justificativa do que se pretende.

Ora, um desses argumentos, como j� foi dito, parte do estudo comparativo das propostas curriculares estaduais e municipais elaboradas a partir do in�cio da d�cada de 80 e vigentes ainda. Essas propostas, nos termos dos PCN, comp�em um quadro nacional confuso, fragmentado, com diferentes n�veis de elabora��o e de justifica��o que dificultaria uma pol�tica global de melhoria do ensino fundamental. Para justificar a necessidade de supera��o dessa situa��o, foi feita uma descri��o das principais tend�ncias pedag�gicas que convivem no Brasil atual e que, resumidamente, transcrevemos em seguida:

�Fazendo uma redu��o necess�ria a este contexto, ser�o expostas as quatro grandes tend�ncias pedag�gicas: a tradicional, a renovada, a tecnicista e aquelas marcadas centralmente por preocupa��es sociais e pol�ticas. (...)

�Pedagogia Tradicional � uma proposta de educa��o centrada no professor, sendo fun��o deste vigiar, aconselhar, corrigir e ensinar a mat�ria atrav�s de aulas expositivas, ficando a cargo dos alunos prestar aten��o e realizar exerc�cios repetitivos para gravar e reproduzir a mat�ria dada.

�A metodologia decorrente baseia-se na exposi��o oral dos conte�dos, seguindo passos pr�-determinados e fixos para todo e qualquer contexto escolar. (...) Na maioria das escolas esta pr�tica pedag�gica foi caracterizada por sobrecarga de informa��es passadas aos alunos, tornando o conhecimento pouco significativo e burocratizado.

�O professor tem papel central no processo de ensino e aprendizagem (...) um organizador dos conte�dos e estrat�gias de ensino e, portanto, o guia exclusivo do processo educativo. (...)

�A Pedagogia Renovada inclui v�rias correntes, que de uma forma ou de outra est�o ligadas ao movimento da Escola Nova ou da Escola Ativa, que embora admitam diverg�ncias, assumem um mesmo princ�pio norteador de valoriza��o do indiv�duo como ser livre, ativo e social. O centro da atividade escolar n�o � o professor nem os conte�dos disciplinadores, mas sim o aluno ativo e curioso. O mais importante n�o � o ensino, mas o processo de aprendizagem. (...)

�O professor � o facilitador no processo de busca de conhecimento do aluno, organizando e coordenando as situa��es de aprendizagem. (...)

�Esta concep��o trouxe a id�ia de globaliza��o e dos centros de interesses que foram inadequadamente transformados em pr�ticas espontane�stas. (...) Essa tend�ncia teve grande penetra��o no Brasil, na d�cada de 30, para o ensino pr�-escolar e at� hoje influencia muitas pr�ticas pedag�gicas.

�Nos anos 70, proliferou o que se chamou de �tecnicismo educacional�, inspirado nas teorias behavioristas da aprendizagem e da abordagem sist�mica do ensino, definiu uma pr�tica pedag�gica altamente controlada e dirigida pelo professor com atividades mec�nicas inseridas numa proposta educacional r�gida e pass�vel de ser totalmente programada em detalhes. (...) O que � valorizado nesta perspectiva, n�o � o professor mas sim a tecnologia, o professor passa a ser um mero especialista na aplica��o de manuais e sua criatividade fica dentro dos limites poss�veis e estreitos da t�cnica utilizada. (...) Esta orienta��o foi dada para as escolas pelos organismos oficiais durante os anos 60 e at� hoje persiste em muitos cursos com a presen�a de manuais did�ticos com car�ter estritamente t�cnico e instrumental.

�No final dos anos 70 e in�cio dos 80, constitu�ram-se as denominadas Pedagogia Libertadora e Pedagogia Cr�tico-Social dos Conte�dos, ambas propondo uma educa��o cr�tica a servi�o das transforma��es sociais, econ�micas e pol�ticas para a supera��o das desigualdades existentes no interior da sociedade.

�A Pedagogia Libertadora tem suas origens no movimento da educa��o popular, no final dos anos 50 e in�cio dos anos 60, quando foi interrompida pelo golpe militar de 1964, e retoma o seu desenvolvimento no final dos anos 70 e in�cio dos anos 80. Nesta proposta a atividade escolar pauta-se em discuss�es de temas sociais e pol�ticos e em a��es sobre a realidade social imediata; analisa-se os problemas, os fatores determinantes e estrutura-se uma forma de atua��o para que se possa transformar a realidade social e pol�tica. O professor � um coordenador de atividades que organiza e atua conjuntamente com os alunos.

�A Pedagogia Cr�tico-Social dos Conte�dos surge no final dos anos 70 e in�cio dos 80 e � uma rea��o de alguns educadores que n�o aceitam a pouca relev�ncia que a pedagogia libertadora d� ao aprendizado do chamado �saber elaborado�, historicamente acumulado e que constitui o acervo cultural da humanidade. (...) Compreende que n�o basta ter como conte�do escolar as quest�es sociais atuais, mas � necess�rio que se possa ter o dom�nio de conhecimentos, habilidades e capacidades para que os alunos possam interpretar suas experi�ncias de vida e defender seus interesses de classe.� (1, 12-13)

Al�m dessa exposi��o das grandes tend�ncias dos modelos vigentes na educa��o brasileira desde a d�cada de 30, os PCN ainda fazem refer�ncia � presen�a, nos �ltimos anos, da Psicologia Gen�tica, que marcou �a pesquisa sobre a psicog�nese da l�ngua escrita� a partir dos anos 80, observando que �a metodologia utilizada na pesquisa foi muitas vezes interpretada como uma proposta de pedagogia construtivista para a alfabetiza��o, o que expressa um duplo equ�voco: redu��o do construtivismo a uma teoria psicogen�tica de aquisi��o da l�ngua escrita e transforma��o de uma pesquisa acad�mica em m�todo de ensino.� (1, 14)

As considera��es anteriores, pretensamente descritivas das principais tend�ncias pedag�gicas hist�ricas na educa��o, justificariam a proposta dos PCN como uma supera��o de modelos que, pelas suas insufici�ncias e equ�vocos, n�o mais t�m condi��o de orientar as pr�ticas pedag�gicas vigentes.

� claro que a proposi��o dos PCN pressup�e que n�o valeria a pena uma atua��o corretiva e reorientadora das v�rias tentativas estaduais e municipais que h� anos se esfor�am para consolidar orienta��es pedag�gicas de seus respectivos siste- mas. A op��o foi a de substitu�-las por �uma refer�ncia curricular para todo o pa�s�.

O texto introdut�rio dos PCN reconhece o car�ter redutivista de suas descri��es das tend�ncias prevalecentes nas orienta��es das pr�ticas pedag�gicas brasileiras, mas esse reconhecimento � meramente formal, pois o que se prop�e � uma substitui��o radical do que existe por uma nova ordena��o curricular.

Por isso, vale a pena adiantar alguns coment�rios sobre a an�lise das propostas curriculares oficiais:

1. O estudo pr�vio dessas propostas tomou como objeto de an�lise documentos oficiais e apontou, aqui e ali, a presen�a de justificativas e declara��es de ades�o a alguns princ�pios. O que se constatou foi a incipi�ncia de algumas iniciativas, a insufici�ncia de outras, a presen�a de contradi��es, de descontinuidades administrativas etc. Nada existe no relat�rio a respeito de como essas propostas t�m repercutido nas efetivas pr�ticas escolares. � apenas uma vis�o gen�rica a respeito de orienta��es curriculares e program�ticas. Utilizar essa vis�o gen�rica como uma radiografia do que ocorre nas escolas � ir muito al�m do que o estudo se prop�s e o seu relat�rio permite. O estudo focalizou alguns documentos e identificou algumas id�ias. Nada mais. Imaginar que essas id�ias animam, de fato, as pr�ticas a que visam pode ser enganoso do ponto de vista te�rico e levar a aprecia��es equivocadas sobre a realidade. Muitas vezes, uma id�ia, uma doutrina s�o inertes, isto �, n�o exercem nenhuma influ�ncia no plano da realidade. Conforme disse A. Lovejoy, �os grandes movimentos e tend�ncias n�o s�o geralmente os objetos que, em �ltimo termo, interessam ao historiador das id�ias, s�o apenas um ponto de partida.� (La gran cadena del ser, Barcelona, Icaria Editorial, 1983) � preciso, pois, ir al�m dos r�tulos e dos �ismos�. Muitas vezes, sob um mesmo r�tulo h�, n�o apenas uma id�ia ou uma doutrina, mas v�rias, combinadas de modos diferentes nos indiv�duos ou grupos que identificamos como seus adeptos. Seria enganoso, pois, imaginar que a utiliza��o de um r�tulo de significa��o amb�gua seja de fato uma descri��o de um estado de coisas. � preciso lembrar ainda que express�es como �pedagogia tradicional�, �pedagogia renovada�, �pedagogia dos conte�dos� etc. s�o correntes nos meios acad�micos, no ambiente de congressos e de semin�rios, mas de duvidoso valor descritivo com rela��o a institui��es e pr�ticas escolares. Ali�s, � usual, nas academias brasileiras, que a pesquisa emp�rica da realidade educacional seja substitu�da pelos cacoetes do �abstracionismo pedag�gico�. Express�es como �escola brasileira� ou �modelo educativo brasileiro� s�o exemplos de entidades ling��sticas semanticamente vazias, embora de amplo curso na ret�rica acad�mica ou pol�tica.

2. � indiscut�vel que o prop�sito dos PCN �, numa primeira etapa, a reforma do ensino fundamental brasileiro. Numa outra ocasi�o, j� tive a oportunidade de dizer que �nas sucessivas reformas da educa��o brasileira, quando chegamos ao momento de uma nova reforma, invariavelmente, n�o se disp�e de estudos sobre a repercuss�o de reformas anteriores sobre a vida escolar. Quase sempre os estudos dispon�veis s�o muito mais julgamentos ideol�gicos do que descri��es confi�veis sobre as altera��es da vida escolar provocadas pelos movimentos reformistas. No entanto, sabe-se que � no interior das salas de aula que se decide o destino de pol�ticas e reformas educacionais. (...) A trajet�ria das reformas desde as decis�es pol�ticas que as instituem legalmente, passando pelas provid�ncias t�cnico-administrativas de v�rios n�veis que a regulamentam, at� as pr�ticas escolares que deveriam implant�-las, � ainda um territ�rio n�o devassado pela pesquisa educacional�.

Nessas condi��es, com a ado��o dos PCN, corre-se o risco de que novamente se fa�a uma reforma de uma realidade educacional da qual temos apenas uma vis�o em grande parte impressionista. � claro que, muitas vezes, uma reforma de aspectos da realidade educacional pode se justificar a partir de decis�es pol�ticas, mesmo na aus�ncia de investiga��es emp�ricas extensas e exaustivas. Mas esse n�o � o caso dos PCN, nos quais s�o preconizadas altera��es das pr�prias pr�ticas escolares em todas as suas dimens�es.

Ali�s, o pr�prio estudo das propostas curriculares vigentes nos estados e em alguns munic�pios observou que

�O quadro que se esbo�a sobre esses produtos depende do olhar e das tintas que podem carregar o tra�ado das dificuldades, dos descaminhos e induzir a uma avalia��o r�gida e reducionista dos resultados obtidos ou podem evidenciar a multiplicidade e riqueza de solu��es aventadas, e os avan�os ineg�veis na formula��o te�rica de uma ampla gama de quest�es afetas ao ensino b�sico, que nada ficam a dever em rela��o �s refer�ncias internacionais dispon�veis. Os sistemas estaduais avan�am no ritmo de suas possibilidades e no esfor�o para identificar e superar suas contradi��es. (...)

�A trajet�ria da constru��o social das propostas curriculares deve ser reconhecida como uma conquista dos educadores, um movimento in�dito que necessita ser valorizado na exata perspectiva das possibilidades postas pela realidade.� (2, 139)

Ora, essas pondera��es n�o podem ser interpretadas como justificadoras de uma proposta curricular nacional que substitua aquelas em vig�ncia nos estados e munic�pios. Pelo contr�rio. Se alguma recomenda��o pode ser extra�da dessas conclus�es � a de que estados e munic�pios deveriam ser orientados e assistidos t�cnica e financeiramente, para corre��o de suas falhas e insufici�ncias. Ali�s, � o que determina o Art. 211 da atual Constitui��o Brasileira.

II. Os PCN e a concep��o construtivista

Os autores do texto introdut�rio dos PCN assumiram um claro compromisso com a concep��o construtivista de aprendizagem e ensino, mas o car�ter sint�tico da exposi��o dificulta, algumas vezes, a percep��o de importantes implica��es desse comprometimento. A preocupa��o de elaborar um texto destinado a amplas discuss�es pelo magist�rio acabou conduzindo a afirma��es simplificadas cujo significado � de dif�cil apreens�o, principalmente para o n�o especialista, como � o meu caso e certamente o de muitas outras pessoas.

Por isso, as quest�es que proponho n�o devem ser recebidas como obje��es, mas como indica��o de dificuldades de entendimento.

1. Ser� que teorias psicol�gicas sobre aprendizagem e ensino devem constituir a matriz para a elabora��o das diretrizes de um projeto curricular nacional?

Parece-me que o texto dos PCN n�o deixa d�vidas a esse respeito, embora aqui e ali haja refer�ncias sem maior import�ncia a cultura, fun��o social da escola, rela��es interpessoais etc. No entanto, n�o me parece evidente que deva haver uma prioridade da Psicologia nesse assunto, embora seja trivial que a ministra��o do ensino sempre pressup�e algumas id�ias sobre aprendizagem e ensino e que muitas dessas id�ias s�o insuficientes ou at� mesmo equivocadas. Portanto, o que se discute n�o � a import�ncia da Psicologia no esclarecimento de algumas quest�es de ensino, mas a sua prioridade em mat�ria das diretrizes curriculares nacionais. Ser� que para discuss�o desse assunto n�o deveria haver uma convoca��o de especialistas em outras �reas da cultura e da vida social como a Sociologia, a Hist�ria, a Antropologia, o Direito, a Religi�o, a Arte etc.? � poss�vel que os autores dos PCN respondam que todas os demais saberes sociais e culturais foram levados em conta no estabelecimento dos conte�dos curriculares. Isso � verdade, mas � apenas meia verdade. A t�nica dos PCN � psicologizante num assunto que nem mesmo pode ser reduzido a uma quest�o cient�fica, qualquer que seja a �rea de abrang�ncia da ci�ncia da qual se parte. Na verdade, as diretrizes nacionais de um curr�culo para o ensino fundamental somente podem ter como matriz a cultura no seu significado mais amplo. Os saberes a serem convocados para a indica��o dessas diretrizes incluir�o obrigatoriamente todos os aspectos culturais da na��o relevantes para a compreens�o do povo brasileiro na multiplicidade de suas pr�ticas pol�ticas, de suas cren�as, tradi��es, manifesta��es art�sticas, religiosas, liter�rias e outras.

N�o se trata apenas de substituir a Psicologia pelo conjunto das demais ci�ncias sociais e humanas. O problema das diretrizes nacionais de um curr�culo de ensino fundamental n�o � uma quest�o estritamente cient�fica, mas sobretudo de acuidade cultural para os valores relevantes na forma��o da cidadania brasileira. Somente um trabalho dessa natureza e amplitude poderia dar base para o envolvimento do magist�rio e a formula��o de pol�ticas de forma��o e de aperfei�oamento do professor.

Teorias sobre como os alunos aprendem e sobre como se deve ensinar podem at� ser importantes em momentos espec�ficos, mas seria um equ�voco tom�-las como ponto de partida para propor solu��es sobre a quest�o das diretrizes curriculares nacionais. Fazer isso � optar por uma vis�o tecnocr�tica da quest�o do ensino fundamental e da forma��o de professores. Diretrizes curriculares s�o mat�ria de ades�o a valores e n�o a teorias cient�ficas.

Embora essa op��o tecnicista n�o esteja claramente explicitada no texto dos PCN, est� muito clara numa passagem de um trabalho de C�sar Coll, um dos principais assessores da iniciativa ministerial. Diz ele:

�Seria um erro, entretanto, pensar que as respostas sobre o que ensinar e quando ensinar determinam unidirecionalmente a resposta sobre como ensinar. A influ�ncia se exerce tamb�m em sentido oposto, pois a resposta �s duas primeiras perguntas depende em parte de como foi entendido o processo de aprendizagem. (...) Assim o que ensinar, quando ensinar e como ensinar s�o tr�s aspectos do curr�culo intimamente interrelacionados; por isso, � absurdo consider�-los de forma totalmente independentes. (...) Com efeito, a concep��o construtivista da aprendizagem escolar e da interven��o pedag�gica, que abrange uma s�rie de op��es b�sicas sobre como ensinar, foi o ponto de partida e o referencial cont�nuo para as decis�es que fomos adotando, a fim de delinear um modelo de Projeto Curricular.

(...) Reiteramos que as op��es b�sicas sobre como ensinar presidem e impregnam a totalidade do curr�culo� (Psicologia e Curr�culo, S�o Paulo, �tica, 1996) [grifos nossos].

N�o temos a inten��o de fazer um escrut�nio do pensamento de C. Coll. Recorremos a essas passagens porque elas lan�am luz sobre a vis�o de curr�culo dos PCN. � o que nos parece.

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Mesmo que n�o se coloque em d�vida a quest�o da prioridade da Psicologia ou da Psicopedagogia, ainda haveria a quest�o da prefer�ncia por uma particular teoria. � compreens�vel que as op��es te�ricas sejam assumidas de maneira persistente por cientistas individuais, mas a pr�pria ci�ncia como um empreendimento cultural coletivo necessita das diverg�ncias e das vis�es antag�nicas, isto �, do pluralismo te�rico. Isso nos leva a uma outra indaga��o.

2. Por que devemos preferir a concep��o construtivista de aprendizagem e ensino a outras?

Os estudos de hist�ria da ci�ncia nas �ltimas d�cadas e o pr�prio desenvolvimento da ci�ncia desde o final do s�culo XIX t�m mostrado que a id�ia da ci�ncia como um conhecimento est�vel e seguro n�o tem fundamento hist�rico nem l�gico. A pretens�o neo-positivista de que somente poder�amos considerar como cient�ficos aqueles conhecimentos que estivessem verificados ou que fossem em princ�pio verific�veis perdeu a sua credibilidade desde as cr�ticas de Popper, Toulmin, Kuhn, Feyerabend, Hanson e de muitos outros. Enfim, o que n�o mais se admite por raz�es hist�ricas e l�gicas � a exist�ncia de teorias que possam ser consideradas como a �explica��o definitiva� dos fatos dispon�veis. Sabe-se, hoje, que os pr�prios �fatos� n�o s�o entidades independentes do observador, isto �, da teoria a partir da qual o mundo � percebido e descrito.

Nesse quadro, ter uma teoria �, num sentido amplo, dispor de um particular conjunto articulado de enunciados e de conceitos que seja capaz de explicar fatos que, de outro modo, seriam estranhos e surpreendentes. � claro que a ci�ncia busca criar teorias verdadeiras, mas apenas consegue confirmar parcialmente as teorias de que disp�e, o que enseja muitas vezes a conviv�ncia de teorias alternativas sobre o mesmo conjunto de fen�menos, todas elas parcialmente confirmadas. Por isso, s� a pluralidade te�rica e a cr�tica m�tua que ela favorece permitem o desenvolvimento do saber cient�fico.

A pretens�o de ter encontrado a teoria verdadeira � uma pretens�o de infalibilidade sem sustenta��o hist�rica nem l�gica. De fato, quem se arroga como infal�vel retira-se do jogo da ci�ncia porque neste, como disse Popper, n�o h� teorias imunes � cr�tica.

Feita essa breve digress�o preliminar, retornemos � pergunta inicial. O texto introdut�rio dos PCN, apesar de em muitas passagens fazer refer�ncia � necessidade de discuss�es e ao car�ter n�o impositivo da proposta curricular, de fato n�o oferece concep��es alternativas para discuss�o, e at� as deprecia, mas exp�e e privilegia uma concep��o. Na parte intitulada �Fundamentos psicopedag�gicos�, h� a clara e sum�ria ades�o a uma concep��o de aprendizagem e de ensino, a uma concep��o de conhecimento, e o seu encaminhamento de uma maneira impositiva, como por exemplo, nos seguintes casos:

�Hoje sabemos que � necess�rio tocar o ponto chave de todo o processo educativo tanto no ensino quanto na aprendizagem, uma vez que, em �ltima inst�ncia, sem aprendizagem n�o h� ensino. A tarefa consiste ent�o em re-significar a unidade entre aprendizagem e ensino. (...) O conceito de conhecimento para o qual convergem as teorias contempor�neas aproxima-se cada vez mais da id�ia de que conhecer � construir significados. (...) Hoje, gra�as ao avan�o significativo da investiga��o cient�fica na �rea da aprendizagem tornou-se poss�vel interpretar o erro como algo inerente ao processo de aprendizagem. (...) O processo de ensino e aprendizagem constitui-se em uma unidade indissol�vel.� (1, 9-11)

Como se pode perceber, o tom dessas afirma��es n�o � o de quem faz uma proposta a ser discutida, mas o de quem comunica verdades. O sentimento de posse da verdade n�o favorece o di�logo e a discuss�o.

N�o se trata, evidentemente, de preconizar um relativismo inconseq�ente, segundo o qual todas opini�es e posi��es t�m o mesmo valor. H� in�meros trabalhos que demonstram o car�ter autocontradit�rio de todo relativismo radical. Trata-se apenas de reivindicar a import�ncia de um pluralismo cr�tico capaz de diferentes encaminhamentos das quest�es de ensino e aprendizagem cuja complexidade n�o recomenda sen�o prud�ncia.

III. Os PCN e a legisla��o

O Art. 210 da atual Constitui��o Federal estabelece, no seu caput, que �Ser�o fixados conte�dos m�nimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar forma��o b�sica comum e respeito aos valores culturais e art�sticos, nacionais e regionais�.

Este seria o fundamento constitucional para a iniciativa do MEC na proposi��o dos Par�metros Curriculares Nacionais. O pr�prio artigo n�o estabelece qual a esfera do Poder P�blico que deveria fixar esses conte�dos m�nimos para o ensino fundamental, embora esteja impl�cito que uma tal tarefa somente poderia ser desempenhada pelo Poder P�blico Federal e, nessa esfera, desde a lei 4.024/61, o assunto foi da compet�ncia do Conselho Federal de Educa��o. Com a extin��o desse �rg�o e sua substitui��o pelo Conselho Nacional de Educa��o (Lei 9.131/95), houve uma altera��o nessa tradi��o.

Nessa nova lei, uma modifica��o feita no Art. 9o, � 1o, letra �C�, da Lei 4.024/61, estabelece que a C�mara de Ensino B�sico ter� dentre suas atribui��es a de �deliberar sobre as diretrizes curriculares propostas pelo Minist�rio da Educa��o e do Desporto�. Em rigor, n�o se pode dizer que o tratamento legal da mat�ria tenha sido em uma dire��o descentralizadora, pois a express�o constitucional �conte�dos m�nimos� transformou-se, na lei, em �diretrizes curriculares� que, evidentemente, � muito mais ampla no seu significado, e retirou-se a compet�ncia de proposi��o do �rg�o normativo, como era da tradi��o.

No entanto, a respeito do amparo legal para a iniciativa ministerial dos PCN, h� um aspecto mais interessante. Trata-se do fato de que n�o houve no texto dos PCN refer�ncia ao Art. 206 da Constitui��o, que fixa os princ�pios segundo os quais o ensino ser� ministrado. O inciso III desse artigo diz que o ensino dever� atender ao �pluralismo de id�ias e de concep��es pedag�gicas�. Retornamos assim � id�ia da necessidade de pluralismo.

Esse retorno n�o � casual. O conv�vio com a diverg�ncia � um valor comum aos ideais da ci�ncia e aos ideais da democracia. No caso da ci�ncia, a possibilidade de florescimento de diverg�ncias visa impedir que sentimentos subjetivos de certeza favore�am a repress�o a id�ias novas e eventualmente an�malas no quadro dos paradigmas prevalecentes. No caso da democracia, a possibilidade de florescimento de diverg�ncias visa impedir que minorias sejam suprimidas pela hegemonia das for�as pol�ticas vencedoras. Em ambos os casos, o pressuposto � o de que a unanimidade de opini�es e o consenso pol�tico n�o s�o garantia, em quaisquer condi��es, de alcance da verdade e de defesa do interesse p�blico.

A compet�ncia privativa da Uni�o para fixar as diretrizes e bases da educa��o nacional n�o inclui a possibilidade de erigir em norma nacional a ades�o a uma particular concep��o pedag�gica que dever� sempre ser op��o de escolas ou de professores para que possa ser, finalmente, op��o das fam�lias.

Nessas condi��es, sem atentar para a exig�ncia constitucional de pluralismo, corre-se sempre o risco de que a proposta dos PCN possa, na pr�tica, nos seus v�rios desdobramentos at� a sala de aula, chegar aos professores como imposi��o e n�o como algo a ser discutido e eventualmente modificado ou substitu�do.

IV. Conclus�es

1. Embora o texto dos PCN refira-se a uma �integra��o com a experi�ncia educacional j� realizada pelos Estados e Munic�pios� e � possibilidade de adapta��es pelas Secretarias de Educa��o, � claro que a pr�pria iniciativa ministerial implica a expectativa de uma profunda altera��o da situa��o atual, com a ado��o de novas diretrizes e de uma nova ordena��o curricular a partir das posi��es e sugest�es preparadas. Ora, na atual Constitui��o Federal, � dos Estados e Munic�pios a compet�ncia de organiza��o de seus pr�prios sistemas de ensino, respeitadas as diretrizes e bases da educa��o nacional. O Art. 210 da Constitui��o refere-se apenas a �conte�dos m�nimos� para o ensino fundamental, mas a lei no 9.131, que criou o Conselho Nacional de Educa��o, ampliou a express�o constitucional para �diretrizes curriculares� a serem propostas pelo MEC. Nessa altera��o, que aumenta o poder central, h� uma evidente diminui��o do grau de autonomia de Estados e Munic�pios. Essa diminui��o de autonomia foi agravada pela iniciativa ministerial elaborando diretrizes curriculares declaradamente comprometidas com uma particular concep��o pedag�gica, desrespeitando assim o princ�pio do �pluralismo de id�ias e de concep��es pedag�gicas�, fixado no Art. 206 da atual Constitui��o.

Esse fato � ainda mais grave porque, al�m de ilegal, representa um desrespeito aos ideais da democracia e da ci�ncia, que se fundam no direito de florescimento das diverg�ncias, �nico caminho para o aperfei�oamento do conv�vio pol�tico e do desenvolvimento do saber.

2. Pr�ticas pedag�gicas s�o institui��es complexas que n�o podem ser reduzidas � aplica��o de uma teoria da aprendizagem e do ensino. H� professores que ensinam com pleno �xito e h� professores que ensinam com �xito menor ou at� mesmo quase nulo. Quais s�o os fatores presentes em cada situa��o de ensino e que condicionam o �xito? � claro que n�o h� respostas simples para essa quest�o. Presumir que o grau de �xito depende de uma correta ou incorreta teoria do ensino e da aprendizagem �, no m�nimo, uma simplifica��o do problema. Al�m daqueles fatores espec�ficos de cada sala de aula e de cada professor, h� o complexo ambiente social de cada escola. Por ignorar essa complexidade, as pol�ticas de aperfei�oamento de docente n�o t�m alterado substantivamente a situa��o do ensino brasileiro.

Ensinar com �xito � ter o dom�nio de uma pr�tica, de um saber fazer. Qualquer teoria do ensino, inclua-se a� portanto a teoria construtivista, � um esfor�o prescritivo, isto �, uma tentativa de elaborar regras para a pr�tica de ensinar. Ora, nem todas as pr�ticas s�o exaustivamente regul�veis. Saber fazer poesia ou saber contar piadas com gra�a s�o, da mesma forma que saber ensinar, o dom�nio de uma pr�tica n�o inteiramente regul�vel. Trata-se das complexas rela��es entre teoria e pr�tica.

S�o essas condi��es que nos levam a pensar que pode ser uma temeridade, de efeitos at� desastrosos, fazer uma tentativa de induzir centenas de milhares de professores a alterar suas pr�ticas a partir de uma teoria do ensino e da aprendizagem que presumimos verdadeira. H� ainda o seguinte agravante: a ampla difus�o dessa teoria, que � muito complexa, poder� transformar-se numa difus�o de slogans e express�es metaf�ricas que, por si mesmas, s�o incapazes de ser operativas na situa��o de sala de aula. O desastre ser� se conseguirmos apenas criar inseguran�a nos professores com rela��o �s pr�prias pr�ticas a partir de um patrulhamento pretensamente fundado em verdades definitivas. Nesse sentido, as diretrizes dos PCN poder�o ser, eventualmente, um desservi�o � autonomia profissional de cada docente e � autonomia pedag�gica de cada escola.

Qual perfil do professor no modelo tradicional?

O perfil do professor tradicional nos dias de hoje preza pelo respeito a sua autoridade, a organização da sala, como por exemplo, carteiras enfileiradas. O professor dessa categoria opta por aulas expositivas e o silêncio absoluto.

Qual é o papel do pedagogo na pedagogia tradicional?

C A figura do pedagogo assume o papel de favorecer o ajustamento do aluno à família e à escola, a fim de que não se desvie das normas.

O que é a tendência pedagógica tradicional?

Elaborada no século XIX, é uma tendência liberal que considera o professor como o agente principal da transmissão do conhecimento. Basicamente, no modelo que mais vemos em que eles falam enquanto os estudantes recebem os conteúdos com uma participação ou outra quanto tem dúvidas.

Quais são as quatro características mais importantes da pedagogia tradicional?

Serão abordadas quatro concepções pedagógicas: a pedagogia católica (escolástica e pedagogia jesuítica), a pedagogia da disciplina mental, a pedagogia sensualista empirista (Comênio, Pestalozzi) e a pedagogia da apercepção deHerbart).