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1 - INTRODUÇÃOOs governos de Brasil e Bolívia possuem um histórico relacionamento que advêm desde a segunda metade do século XIX, do período em que o Governo Imperial brasileiro pautava suas relações exteriores pelo princípio do uti possidetis1 e que teve na questão da livre navegação dos
rios platinos e amazônicos, o ponto de partida para as suas articulações no contexto regional. [...] é composta pelas ‘faixas’ territoriais de cada lado do limite internacional, caracterizadas por interações que, embora internacionais, criam um meio geográfico próprio de fronteira, só perceptível na escala local/regional das interações transfronteiriças (BRASIL, 2005, p.152). A partir desse pressuposto, o meio geográfico que melhor representa a Zona de Fronteira seria aquele formado pelas
cidades-gêmeas 6, dotadas de intensos fluxos internacionais de bens, capitais e pessoas, caracterizadas por simetrias e assimetrias infraestruturais que decorrem das dinâmicas 7 e da função que exercem no processo de divisão
territorial do trabalho para os seus respectivos países. 2 – DOS RIOS ÀS ARTÉRIAS LESTE-OESTESegundo Xavier (2006) a partir da primeira metade do século XIX o Governo Imperial brasileiro, no auge do Segundo Reinado (1840-1889), passou a estabelecer negociações diplomáticas em relação aos seus limites territoriais com os países andinos: Mesmo sem lograr acordos permanentes, estes permitiram delinear as diretrizes que seriam centrais na política externa brasileira, para a preservação da unidade territorial, com a delimitação de limites e o problema da livre navegação dos rios, fontes de divergências e confrontos na política intrarregional (XAVIER, 2006, p.87). Nesse período a política de limites era um dos pontos fundamentais para a ideia de soberania dos novos Estados sul-americanos que surgiam. Nesse contexto a busca pela nacionalidade mediante a demarcação dos limites territoriais apareceria para o Estado brasileiro como um dos seus principais postulados para o desenvolvimento de uma política externa consistente. Logo, o Estado brasileiro na segunda metade do século XIX engendrou uma política externa que consistiu em intervenções na Bacia Platina através de Tratados de Aliança, comércio, limites, livre navegação e, sobretudo, acordos de caráter militar (ofensivos - defensivos) com o governo
de Montevidéu, as províncias de Corrientes e Entre-Rios e Paraguai, com a intenção de conter os avanços de Buenos Aires sob o comando de Juan Manuel Rosas 8. Alianças que se davam concomitantemente às ações diplomáticas que visavam garantir o domínio sobre os “territórios” amazônicos. O empreendimento foi de iniciativa particular, com apoio tácito do governo de Washington e pressões arrogantes de seu representante no Rio de Janeiro, Willian Trousdale. O êxito dependeria de uma condição prévia, a abertura do Amazonas à navegação e ao comércio internacionais, uma reivindicação apoiada igualmente por França e Inglaterra, à época em que se cultivava o mito do eldorado produtivo da região (CERVO, 2008, p.102). A aspiração dos Estados Unidos sobre a navegação na Bacia Amazônica também estava correlaciona a um possível acesso, por via fluvial, do oceano Atlântico para o Pacífico e vice-versa (COSTA, 1992, p.68). No século XIX já existiam possibilidades, por meio do próprio “território” boliviano, do Pacífico se chegar ao Atlântico pelos rios bolivianos
na Bacia amazônica, através dos rios Beni, rio Mamoré, onde se inicia o rio Madeira, que deságua no Amazonas, ligando-se assim ao Atlântico (LINO, et al., 2008, p.96). Tais possibilidades criaram divergências entre o Governo Imperial brasileiro e o governo boliviano. De um lado, ela se batia para preservar a região de acesso ao oceano Pacífico, sobre a qual o Chile avançava e terminaria por conquistar-lhe em 1879. De outro, procurava abrir rotas de navegação para o oceano Atlântico, através do Paraguai, até o rio da Prata, e do Madeira- Mamoré, pela bacia do Amazonas, defrontando-se, principalmente, com os obstáculos que o Império do Brasil lhe criava, a fim de impedir que, sob o escudo da Bolívia, outras nações estrangeiras se introduzissem em suas possessões (XAVIER, 2006, p.92). Devemos também ressaltar que as disputas internas pelo poder, permitiam aos governos bolivianos engendrarem uma política externa baseada em interesses pessoais e conjunturais, fato que deixava esse Estado susceptível as ações externas, principalmente, pois a falta de recursos para financiar e viabilizar infraestrutura ensejava a aproximação com nações estrangeiras, com explícitos interesses no continente. [...] as pretensões da Bolívia estendiam-se, na margem direita do rio Paraguai, entre a Baía Negra e o Jaurú, isto é, ao trecho da costa fluvial pertencente ao Brasil, reconhecido, indevidamente, naquele tratado, como paraguaio. (CARVALHO, 1958, p.32). Sendo a área reivindicada pela Bolívia pertencente ao Brasil, mais do que depressa, o governo imperial em agosto do mesmo ano de 1852, também emitiu uma nota de protesto a Buenos Aires, junto ao governo da Confederação Argentina, através do Ofício nº 16, encaminhada por Rodrigo de Souza e Silva Pontes. O protesto aludia contra algumas disposições do Tratado entre Argentina e Paraguai, que se fossem executadas “poderiam talvez ofender interesses e direitos do império” 10 . Segundo Carvalho (1958): Entre essas disposições estava a concernente ao reconhecimento da soberania do Paraguai sobre o rio do mesmo nome, de margem a margem, até a confluência com o Paraná. E, reportando-se ao protesto da Bolívia, baseado na presunção de que era ribeirinha do rio Paraguai, pela costa ocidental, entre os graus 20 e 22, declarava o nosso representante em Buenos Aires não poder ser ela assim considerada, enquanto o governo do Brasil, em resultado de negociações pendentes lhe não cedesse uma parte da costa, naquele trecho do rio. “E, por isso, dizia, não só protesta contra as asserções e protesto do Sr. Encarregado de Negócios da Bolívia, mas também contra qualquer ato pelo qual o Governo desta República seja considerado ribeirinho do Paraguai, com prejuízo, e sem respeito aos direitos e interesses do Brasil” (CARVALHO, 1958, p.33/4). Estava assim instalada uma tensão diplomática entre Brasil e Bolívia, já que o protesto do governo brasileiro rechaçava as pretensões bolivianas na Bacia do
Prata, que veio posteriormente a refletir na questão concernente a livre navegação nos rios da Bacia Amazônica em “território” brasileiro. Mesmo com os rechaços brasileiros às reivindicações territoriais bolivianas em relação ao Chaco Boreal (que dava acesso ao Prata e consequentemente ao Oceano Atlântico), em 1853 o Ministério da Relações Exteriores da Bolívia, através de um decreto presidencial, declarou as nações estrangeiras que estavam “ [...] libres para el comercio y navegación mercante
de todas las naciones del globo, las aguas de los ríos navegables, que fluyendo por el territorio de la Nación, desembocan en el Amazonas y el Paraguay” (COELHO, 1992, p.85). [...] só a franqueou ao tráfego internacional, em 1866, porque ao enfrentar o Paraguai, receou que as Repúblicas do Pacífico entrassem no conflito, instigadas pelos norte-americanos e/ou ingleses, que dominavam já vastas extensões daquela rede fluvial nos territórios do Equador e do Peru (BANDEIRA, 1985, p.143). A Bolívia, igualmente, somente obteve acesso aos rios da Bacia Amazônica no ano de 1866, momento em que também começou a negociar os seus limites “territoriais” com o Brasil. A resolução definitiva da sua contenda com o governo Imperial brasileiro, apenas acontecera com o Tratado de Amizade, Limites, Navegação, Comércio e Extradição (Tratado Ayacucho), de 27 de março de 1867, que concomitantemente, resolveu as questões relativas aos limites entre os dois países e evitou, de uma forma mais acintosa, a participação do governo do presidente boliviano Marian Melgarejo na Guerra do Paraguai em favor de Solano López. Estudando essa temática, Pereira (2007) afirma: O Governo Imperial evitou que a Bolívia do Ditador Marian Melgarejo participasse da guerra em favor de Solano López ao assinar Tratado de La Paz de Ayacucho, em 27 de março de 1867, e também por franquear a navegação do Amazonas e do Madeira, logo a seguir (PEREIRA, 2007, p.186). As ações do governo Imperial brasileiro garantiram a neutralidade da Bolívia em relação ao conflito, fato que implicou também, a partir de 1867, a não utilização do “território” boliviano como escoadouro de equipamentos bélicos que abasteciam as tropas de Solano López. Sabe-se que Solano López recebeu armas do complexo industrial norte-americano através do “território” boliviano, utilizando o porto da cidade de Corumbá/MS, inserido no trajeto Nova York-Panamá-Lima-Corumbá (BANDEIRA, 1985, p.128). Rota que pelo rio Paraguai e subsequentemente o rio do Prata possibilitava a conexão com o Atlântico. Mas, o envolvimento estadunidense com o governo paraguaio durante a Guerra da Tríplice Aliança não se resumiu a esse acordo comercial. Luiz Alberto Moniz Bandeira afirma que: [...] tais petrechos bélicos, ao que parece, procediam dos Estados Unidos, cujo apoio ao Paraguai, desde 1865, Saraiva [Ministro de Negócios Estrangeiros], ocupando o Ministério dos Negócios Estrangeiros, já previra. O serviço secreto do governo imperial, logo no início da conflagração, interceptara um documento, em que Charles A. Washburn, ministro norte-americano em Assunção, prometia ajuda ao Paraguai, para combater o Brasil (BANDEIRA, 1985, p.127). O envolvimento do governo estadunidense foi mais além, quando se verificou a sua não neutralidade no conflito platino, os Estados Unidos inclinavam-se (pelo menos no discurso) a favor do Paraguai, em protesto das ações da Tríplice Aliança: Seu congresso recomendou ao Departamento de Estado que oferecesse os bons ofícios para acabar com a guerra da Tríplice Aliança, cuja continuação continuava ‘absolutamente destruidora do comércio, injuriosa e prejudicial às instituições republicanas’ (BANDEIRA, 1985, p.135). O governo Imperial considerou inadmissível, o indício de favor ao inimigo (ao Paraguai), sem nenhuma imparcialidade no gesto. Tal declaração configurou-se como uma afronta as instituições do governo imperial brasileiro, o Barão de Cotegipe, Ministro dos Negócios Estrangeiros, mediante tal conjuntura, teceu o
seguinte comentário: “bons ofícios para salvar instituições que não corriam o menor risco era ofender o Brasil” 11 . [...] fortalecer a navegação do Amazonas com a criação de uma companhia brasileira encarregada, com exclusividade, do comércio e da colonização, para impedir a ocupação estrangeira, estudar a fundo o direito internacional dos rios para armar-se no campo jurídico, conceder o direito de navegação aos ribeirinhos superiores, mediante convenção, para excluir os não ribeirinhos, confrontar a campanha norte-americana pela ação diplomática e protelar a abertura até desaparecer o risco de dominação estrangeira. De acordo com esses critérios a política externa brasileira para a Amazônia foi executada com êxito (XAVIER, 2006, p.101). Assim, a partir das constrições entre Brasil e Bolívia, durante a primeira metade do século XIX, envolvendo a livre navegação dos rios Amazônicos e Platinos e a demarcação de limites territoriais, podemos perceber as diferentes diretrizes, enquanto Estados independentes, em relação aos seus papéis na política
intra-americana. A partir de 1859 e no decorrer da década de 60, a preocupação se acentua com a fronteira, tanto do governo Imperial como do governo provincial de Mato Grosso, especialmente no tocante a localidade fronteiriça boliviana denominada San Mathias, distante 80 km da localidade brasileira de Vila Maria (atual Cáceres, Mato Grosso). A preocupação de que pudesse ocorrer uma agressão armada por parte da Bolívia, fez parte das comunicações trocadas durante esses anos (XAVIER, 2006, p.110). Assim, as áreas de
fronteira com a Bolívia passariam a constituir-se numa das principais fontes de preocupações para o Governo Imperial brasileiro. Caso a Bolívia conseguisse a posse do Chaco Boreal, conseguiria pleno acesso ao rio Paraguai e a Bacia Platina, passando a possuir um importante peso nos negócios da Bacia do Prata, estratégica para o Governo Imperial do Brasil. O tratado integrou oficialmente o espaço da fronteira oeste do país, daí por diante o Estado Imperial ambicionava uma integração interna, material, econômica e cultural ao corpo da pátria. O fim da Guerra da Tríplice Aliança deixaria mais aguda à necessidade. Da mesma forma, os dirigentes bolivianos, também portadores das ideias de integração territorial e nacional, procuraram atuar em sua fronteira leste. Continuava a prevalecer a ideia de “sertão” e de “fronteras vacias” de um lado e outro, mas era inadiável a chegada do progresso para estas regiões. Para que pudessem usufruir do progresso, a elas deveriam ser levados os instrumentos modernos que as colocassem em sintonia com os centros de civilização (XAVIER, 2006, p.121). A província de Mato Grosso, como entidade político-administrativa situada na fronteira, passou a ser objeto de debates e de projetos que vislumbravam criar condições mais contundentes para a defesa do “território”. É preciso ressaltar que o Tratado de Ayacucho de 1867, fora assinado, dentre outros motivos, porque existia por parte do governo boliviano um
interesse de participar da Guerra do Paraguai junto às forças de Solano Lopez. Dali as embarcações menores redistribuíam as mercadorias e as informações com destino a Cuiabá, Cáceres, Barra dos Bugres, Porto Esperança, Miranda, Aquidauana, Coxim e também Puerto Suarez. Desses portos, para outros núcleos desprovidos de rede fluvial, as mercadorias eram transportadas no lombo de burros ou em carros de boi (XAVIER, 2006, 143). A cidade de Corumbá/MS contava com um porto alfandegado, como também, estava estrategicamente localizada para a atividade comercial. A alfândega fazia a arrecadação do imposto de importação e dos produtos exportados pela cidade. Queiroz (2008) também explica que o desenvolvimento do capital
mercantil decorreu, sobretudo, das medidas adotadas pelo Governo Imperial brasileiro, que desde 1866 isentava de impostos o porto alfandegado da cidade, isenções fiscais prorrogadas em 1872, com vencimento até o ano de 1878. [...] funcionavam em Corumbá 25 bancos internacionais como o City Bank e a moeda corrente era a esterlina. Em 1914 foi instalada na cidade a 14º agência brasileira do Banco do Brasil. O centro urbano cresceu sob o impulso do movimento fluvial e mercantil, em determinadas épocas a população estrangeira na região chegou a superar numericamente a brasileira, aumentando o número de casas comerciais [...] Corumbá mais se beneficiou, pois havia de aproveitar a chance histórica que o desenvolvimento comercial lhe oferecera como centro e não fim de linha, para ser então, mesmo que brevemente, a maior cidade do estado (XAVIER, 2006, p.141/2). Corumbá/MS tornou-se um centro de atração de estrangeiros, nas últimas décadas do século XIX passou a receber imigrantes portugueses,
italianos, sírios e otomanos, ocupados com o comércio, esse grupo de comerciantes dominou a administração e a política da cidade, voltando-se para seus interesses e pouco realizando a favor da sociedade local. Havia uma dualidade na estrutura social que se formava, de um lado um grupo reduzido que monopolizava o comércio e, do outro a maior parte da população que sobrevivia de forma precária, servindo de mão-de-obra barata no porto. A cidade se dividia em duas partes, a de cima que estava sobre a elevação calcária, ficava o comércio e a de baixo que ficava na altura do rio, e se comunicava com a outra através de duas ladeiras, localizava-se o Porto Geral com os galpões de importadores e exportadores e, seus importantes edifícios públicos e comerciais de até três andares (XAVIER, 2006, p.142). Ademais, com a condição de cidade portuária, barcos vindos de vários países atracavam no porto de Corumbá/MS e como não havia controle sanitário, doenças começaram a surgir. Existiam problemas
na infraestrutura, o transporte de mercadoria e o abastecimento de água potável eram precários e a falta de saneamento causou epidemias em muitas ocasiões. Problemas sociais que foram agravados pelas periódicas enchentes do rio Paraguai, ocasionando problemas econômicos, como também, as crises políticas e a violência se faziam presentes no seu cotidiano (SIMON & CARDOSO, 1914, p.9). Todas essas atividades comerciais, estimuladas pelo capital
estrangeiro, dependente da navegação fluvial com o exterior, proporcionaram para Corumbá/MS a condição de economia dependente dos países importadores, assim como, à cidade tornava-se susceptível a crises periódicas. [...] apreensivo com a penetração e o lucro estrangeiros, o governo brasileiro procurou desenvolver uma alternativa de comunicação com a construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (NOB), que atingiu Porto Esperança, na margem esquerda do rio Paraguai, próximo a Corumbá, por volta de 1914 (XAVIER, 2006, p.143). Todavia, mesmo antes do Governo Imperial
perceber a penetração do capital estrangeiro na cidade e a acentuada aproximação desse território com outros Estados (percepção que, no início do século XX, posteriormente levariam a materialização da estrada de ferro Noroeste do Brasil), no período posterior a 1870, quando se restabeleceu a navegação do rio Paraguai e ocorrera à reativação da economia na Província de Mato Grosso, reforçou-se o desejo das lideranças políticas em construir estradas terrestres. Segundo seus discursos, tais
empreendimentos facilitariam as comunicações da província, consideradas vitais para o seu desenvolvimento (GALLETI, 2000, p.163). Considerando que, além de justo, é conveniente abrir as riquissimas zonas de Goyaz e Matto Grosso ao commercio e á industria, trazendo-as ao convivio do progresso e alargando o campo de fecunda immigração que traz rapido e efficaz concurso á grandeza nacional [...]. Considerando que as grandes linhas de communicação norte-sul e éste-oeste aproveitam ás vias fluviaes interiores, ás quaes póde ligar-se a viação de todos os Estados Unidos do Brazil 14. Projeto que se tornava vital e imprescindível para “estreitar os laços de relações politicas e commerciaes dos differentes Estados do Brazil entre si e com a Capital Federal” (Idem, p.1). Essa ferrovia começou a ser construída em Bauru, em 1905, com o propósito de atingir Cuiabá, a capital do Estado de Mato Grosso; contudo, logo esse objetivo foi alterado, sendo definido novo ponto final: a cidade de Corumbá, no SMT [Sul de Mato Grosso]. Já em 1908 a construção foi iniciada também pela extremidade sul-mato-grossense – embora a partir do local denominado Porto Esperança, também situado às margens do rio Paraguai, mas muito a jusante de Corumbá. Assim, o trecho Bauru – Porto Esperança foi dado por concluído em setembro de 1914 (QUEIROZ, 2008, p.53). Provavelmente, essa mudança de traçado para Corumbá/MS possui uma relação com o fato de a localidade apresentar uma grande aproximação com o capital estrangeiro e sendo uma área de fronteira, as preocupações do Governo Imperial aumentavam, sobretudo, porque ali as conjunturas belicosas podiam se fazer presentes. Queiroz (2008) também
ressalta que a cidade de Bauru já estava ligada a São Paulo e ao porto de Santos por via férrea, assim a noroeste (NOB) era vista como uma futura ferrovia transcontinental, “que ligaria Santos ao porto de Arica ou ao de Antofagasta, no litoral do Pacífico”. Na década de 1880 surgiu um novo projeto de Estado, a elite mineira passou a controlá-lo diretamente,
também, foi elaborada uma nova Constituição, reafirmando os princípios liberais. A partir de 1884 passou a controlar o poder a chamada Oligarquia Conservadora, período que tanto o Partido Liberal como o Conservador definiram suas linhas políticas e os sucessivos governos passaram a concentrar-se no projeto modernizador [...]. A política externa procurou fazer um acordo com o Chile e promover a construção de importantes estradas de ferro. Teve início a exploração do Chaco, e a abertura da
economia extrativa ao mercado internacional, importando capital e tecnologia. Iniciou uma aproximação maior com a Argentina e entre 1883 e 1907, os dois países firmaram vários acordos para construção de ferrovias, ligando seus territórios. Em 1889, foi firmado o Tratado de limites pelo qual se reconhecia como argentino o Chaco Central a oriente e uma parte da Puna do Atacama ao Ocidente. A Bolívia ficou com os direitos sobre Tarija. Seis anos depois, em 1895, a Bolívia declarou toda a Puna de
Atacama de direito argentino, isso produziu o Protocolo Cano-Rocha; a entrega deste território alarmou o Chile, que considerava como de sua jurisdição este território. [...] No âmbito dessa política modernizadora teve início a construção de um ramal ferroviário vital, que ligava o porto chileno de Antofagasta à cidade de La Paz e dava à Bolívia o acesso ao mar pela primeira vez na história; estabelecendo o início da moderna rede ferroviária. Com o Brasil, foi assinado em 1882, o Tratado que
constituiu o complemento da cláusula IX do Tratado de Ayacucho de 1867, pelo qual o Brasil se obrigou a conceder a Bolívia o uso de qualquer estrada de ferro que viesse a construir por si, ou por empresa particular, desde a primeira cachoeira na margem direita do rio Mamoré até a de Santo Antônio, no rio Madeira. Cinco anos depois foi assinado, entre os dois países o Tratado de Amizade, Comércio e Navegação. Procurou os ofícios do Brasil no sentido de solucionar seus problemas fronteiriços com o
Paraguai, obtendo um apoio oficioso (XAVIER, 2006, p.156/7). E o meio proposto por um engenheiro militar de formação para obter esse objetivo eram os “transportes” (grifo nosso). Esses seriam os artefatos que auxiliariam no processo de consolidação da unidade nacional, interligando o Brasil do litoral com os demais estados federativos e também com os vizinhos sul-americanos, fazendo então a modernização do país com a articulação das vias fluviais e a construção de ferrovias (XAVIER, 2006, p.183). A união das pretensões regionais tanto de Brasil quanto da Bolívia veio a recrudescer com o início do ciclo da borracha entre o final do século XIX e início do XX, tais atividades passaram a atrair para o norte do Brasil milhares de migrantes que foram trabalhar nos seringais. A disseminação dos chamados seringueiros pelo “território” de floresta amazônica acabou alcançando
inclusive as áreas que se encontravam fora das fronteiras brasileiras, ou seja, o território do atual Estado do Acre, que até então pertencia à Bolívia, desde os tratado de limite assinado em 1867. [...] com a construção da ferrovia Madeira-Mamoré, que seria usada para o escoamento, via oceano Atlântico, da borracha produzida na Bolívia. A referida ferrovia foi construída entre 1907 e 1912 às custas de inúmeras vidas, mas nunca operou regularmente por não terem construído os canais fluviais necessários para o escoamento da produção. Além disso, com o fim do ciclo da borracha, os interesses de integração física concentraram-se ao sul da fronteira, dando origem a novos projetos que visavam a oferecer à Bolívia uma saída pelo Atlântico via Porto de Santos (MEROLA, 2009, p.7). Assim, malogradas as tentativas de Bolívia e Brasil em obterem vantagens econômicas com o comércio da borracha, é nesse contexto que surgem as negociações que resultariam na construção da Estrada de Ferro Corumbá/MS - La Santa Cruz de la Sierra, que posteriormente conectou-se com a Ferrovia Noroeste do Brasil
(NOB) e “contou com os recursos previstos no Tratado de Petrópolis que inicialmente seriam destinados integralmente à construção da Ferrovia Madeira - Mamoré” (MEROLA, 2009), sendo concluída na década de 50 do século passado. 2 - BOLÍVIA: O CENTRO NODAL DA AMÉRICA DO SULNo início do século XX, durante a conjuntura que levara Brasil e Bolívia a assinar o Tratado de Petrópolis, Euclides da Cunha, no livro Peru versus Bolívia, escrito como instrumento de defesa do Tratado, aludia ao papel singular da Bolívia no complexo sócio - geográfico - político da América do Sul (XAVIER, 2006, p.176). Como também, em À Margem da História, esse autoralertava ao governo brasileiro para a expansão da Argentina rumo ao “território” boliviano: [...] verifica-se que a Argentina [...] acaba de efetuar a mais notável de suas operações; e figuram-se de tal porte os seus efeitos, que é escusado o inquirir se ela entrou na República contérmina sobre uma via permanente impecável, ou inquinada dos vícios de um primeiro estabelecimento vertiginoso. Todo o ponto em que ela chega à Bolívia. Por imperfeita que seja a tração de uma linha, onde as vezes se chegou escandalosamente ao assentamento de dois km de trilhos e dormentes por dia, e embora se lhe dê a velocidade escassa de 35 Km por hora, o resultado final é este; vai-se, hoje, de Buenos Aires às terras bolivianas em dois dias e meio (CUNHA, 1995, p.324). Sendo assim, mediante a empreitada Argentina, afirmava que na falta de êxito no projeto da estrada de ferro Madeira-Mamoré, o antagonismo brasileiro para contrapesar o imperialismo ferroviário argentino “[...] delineia-se neste momento numa estrada de ferro, que se não desviará de uma diretriz intorcível e será a seção mais dilatada das
transcontinentais sul-americanas. É a Noroeste do Brasil” (CUNHA, 1995, p.327). Realmente, articulando aos caminhos bolivianos que partam de Corumbá ou de suas cercanias na faixa ribeirinha até a lagoa Gaíba, ela se destina a ligar a Bolívia e o Chile ao Atlântico, ao mesmo passo que seguindo por Santa Cruz de la Sierra e Cochabamba, transpondo as cabeceiras navegáveis do Guaporé e Chimaré, prosseguindo para Oruro, ponto forçado da Pan American Railway, e para La Paz, de onde derivará pela estrada de Arica, o Brasil se aproximará consideravelmente do Pacífico (CUNHA, 1995, p.333). Xavier (2006) afirma que “A Noroeste tinha para Euclides um valor imenso, pois traria a possibilidade de contato entre o Atlântico e o Pacífico. Era uma integração continental efetiva”, como também: Euclides [...] procurava mostrar a importância que as ferrovias tinham para os dirigentes norte-americanos. Grifando a quantidade de linhas férreas existentes nesse país, para ele eram as responsáveis pela vanguarda comercial dessa nação. A questão das ferrovias está subjacente ao assunto “imperialismo” [...] Mostrava que elas cobriam todo o território americano e estavam articuladas com as rodovias, formando redes de conexão, cujo desenho possibilitou a ligação do Atlântico [...] com o Pacífico (XAVIER, 2006, p.192). Assim, Cunha (1995) frisava: “Realmente, quando os Estados Unidos conseguiram em 1898 que a Espanha, dessangrada, lhes cedesse
às três mil ilhas das Filipinas, a sua política deslocou-se para o Pacífico” (CUNHA, 1995, p.357). No campo intelectual, a geopolítica de Travassos sofreu uma influência determinante de Mackinder, com sua teoria sobre o poder terrestre. Essa teoria foi reelaborada e aplicada de forma criadora às condições peculiares do continente sul-americano, com o planalto boliviano assumindo o papel de área-chave com importância análoga à do “heartland” euroasiático. Para Travassos, o controle da Bolívia, região pivô do continente, outorgaria ao Brasil o domínio político-econômico sul-americano (MELLO, 1985, p.73). O esquema de Travassos baseava-se na posição do “território” brasileiro no continente sul-americano, marcado, como afirmou, por dois antagonismos: o Atlântico versus o Pacífico (COSTA, 1992, p.203). Tal proposição estava essencialmente assentada na natureza
geográfica do “território”, mas que determinavam os resultantes geopolíticos pautados nas políticas de expansão das áreas de influência dos dois principais Estados do continente (Brasil e Argentina), que em sua opinião, resultaria numa inevitável disputa hegemônica. Como se vê, Buenos Aires está ligada, diretamente, por estrada de ferro, com as capitais de três países limítrofes. Com assunção, dobrando via fluvial, e, de passagem, assegurando o contato (Concórdia-Salta), entre as redes argentina e uruguaia. Com Santiago (e Valparíso) por meio da via férrea de montanha que vincula a riqueza andina com o Atlântico. Com La Paz, pela soldagem em Tupiza, da via argentina com as linhas bolivianas, após seus trilhos percorrerem até La Quiaca a bagatela de 1.795 km (TRAVASSOS, 1947, p.55). O autor assim sintetizava a sua preocupação ao demonstrar a dianteira da Argentina na corrida (como um dia o fez Euclides da Cunha), através da projeção ferroviária que atraía para o Prata a economia do “heartland” sul-americano. As preocupações de Mario Travassos se davam, principalmente, com a articulação terrestre Buenos Aires – La Paz, pois esta extensão da influência argentina sobre a zona de transição
entre os dois “antagonismos” dava a mesma o controle sobre o “heartland” da América do Sul (COSTA, 1992, p.204). [...] a Bolívia estava no centro das atenções dos dois maiores Estados da América do Sul. Os bolivianos, por outro lado, estavam atentos para a sua situação estratégica na região, com a possibilidade concreta de uma saída para o mar pelos rios Paraguai e Paraná. A vinculação ferroviária com Argentina e Brasil era essencial dentro de seus projetos (SOUZA, 2004, p.45). Esse é o contexto dos governos pautados pelo Socialismo
Militar16 na Bolívia que instaurou mecanismos de intervenção na economia, limitando o poder das antigas elites do estanho. A nacionalização das riquezas naturais, sobretudo, a partir do confisco das propriedades da Standard Oil, tornava-se então a chave para a atração de capitais brasileiros e argentinos com o objetivo de construir vias de
comunicação para a exploração do petróleo nacionalizado. [...] como uma área estratégica e rica em recursos uma vez que nela se encontra o Divortium aquarium (divisor de águas) sul-americano. Posteriormente, outros autores bolivianos acrescentaram a essa posição a idéia de que a integração nacional da Bolívia era fundamental para o equilíbrio territorial sul-americano e dotado desse epíteto, tornava-se evidente que o território boliviano era um ponto fulcral para a integração das diversas regiões do continente sul-americano (PFRIMER, 2011, p.134). É somente com o arrefecimento das práticas geopolíticas de contenção nos anos de 1980 e com a instalação da conjuntura caracterizada pelas aproximações entre Brasil e Argentina (que passaram a buscar instrumentos para a cooperação econômica e a integração), é que os postulados geopolíticos defensores do “território” boliviano como área de obliteração,
foram sendo relegados a um plano secundário. [...] observando a sua reconhecida importância estratégica, porém, não para a finalidade de contenção, mas sim para a de integração nacional e regional de forma a fazer face a interesses externos aos sul-americanos. Verifica-se ideologicamente que o imaginário geopolítico boliviano procura amalgamar o fragmentado território boliviano, com finalidade de solidificar a indentidade nacional a partir de suas características fisiográficas. Daí por exemplo a tese do “macizo boliviano” de Jaime Mendonza (1935), que defendia a idéia de que ao invés de fragmentar as regiões bolivianas, a fisiografia do território nacional era um fator de coesão nacional por meio da identificação com a paisagem andina (PFRIMER, 2011, p.135). Dessa forma, ficam evidentes que os discursos geopolíticos, sejam os brasileiros, argentinos e/ou os bolivianos acerca do “território” boliviano, procuraram justificar e legitimar práticas geopolíticas. Assim, é fato que disputa pela hegemonia continental, que instrumentalizou o supracitado “território”, fez com que Brasil e Argentina aplicassem
grande parte de sua Geopolítica Formal na Bolívia. 3 – A MATERIALIZAÇÃO DOS CORREDORES DE EXPORTAÇÃOSegundo Osmar Ramão Galeano de Souza, Brasil e Bolívia, desde o final da década de 1920, passaram a se articular no interior de uma diplomacia pautada por critérios econômicos com tendência a cooperação. Essas “negociações giravam em torno do petróleo e da resolução de problemas de infraestrutura física”, assim como, confirmava-se: [...] a estrutura de núcleo de permanência e estilo da política bilateral, ao mesmo tempo em que se consolidava uma pauta de negociação envolvendo fronteira, energia e comunicação. Com passar das décadas estas pautas se moldavam às necessidades de cada país (SOUZA, 2004, p.13). Souza (2004) também ressalta que o entorno político da América do Sul foi fundamental para que Brasil e Bolívia cristalizassem suas relações bilaterais, esse elemento foi influenciador, juntamente com a contundente política externa dos Estados Unidos, que no início do século XX passou a ser
considerada com grande força decisória nas relações dos países do mencionado continente. [...] um novo planejamento territorial, orientado pelo economista americano Marvin Bohan, passou a ser implementado. Tratava-se de utilizar para financiamentos do setor agroexportador em Santa Cruz todo o capital arrecadado pela tributação da atividade mineradora no altiplano [...]. O objetivo principal almejado pelo novo planejamento territorial e a geopolítica prática boliviana era a criação de um eixo de ocupação em sentido leste-oeste. Esse projeto se baseava na teoria dos corredores econômicos, do qual La Paz, Cochabamba e Santa Cruz de La Sierra seriam pólos de desenvolvimento econômico. Ademais, estando cada pólo de desenvolvimento localizado em um piso ecológico (altiplano, vales e llanos respectivamente) facilitaria a integração nacional (PFRIMER, 2011, p.136). Essas medidas promovidas pelas políticas do governo boliviano não tardaram a modificar a produção territorial. A concepção de corredores de exportação (corredores econômicos) promoveu a abertura de uma série de estradas, ensejando um grande fluxo migratório e
a criação de uma série de novos municípios. [...] as necessidades geradas pelo acelerado desenvolvimento industrial brasileiro que demandava o incremento das exportações, atribuindo ao comércio exterior papel estratégico. Assim, o Plano Nacional de Desenvolvimento para o período 1972/74 passou a considerar a implementação dos corredores de exportação como canais de saída em massa entre as áreas produtoras e os pontos de destino dos produtos (ZUGAIB, 2006, p.119). Ressalta-se que embora a
política dos corredores de exportação17 somente viesse a ser acentuada a partir de 1974 como canais de integração, Mario Travassos já a aconselhava desde 1931 como mecanismo de fuga do poder concêntrico de Buenos Aires em relação à desembocadura do Rio do Prata. Para Castro (1983), os países mediterrâneos “gostariam de dispor de novos caminhos em direção ao
Atlântico” (CASTRO, 1983, p.147). [...] o chamado “ajuste estrutural”, que consistia na adoção de políticas monetaristas que visavam forçar a contração da economia e que tinham como objetivo liberar excedentes exportáveis e diminuir as importações, permitindo a manutenção de elevados superávits comerciais, que possibilitariam a aquisição de dívidas necessárias para o aumento da enorme divida externa [...] ou o enfrentamento da dependência, com o Estado aumentando os investimentos públicos, auxiliando a substituição de produtos importados por produção interna, dando preferência ao capital nacional, regulamentando melhor a atuação do capital estrangeiro e adotando políticas que visassem diminuir a concentração de renda (PINTO, 2008, p.120). O Brasil adotou a segunda opção, indo ao encontro do projeto que visava estabelecer os corredores de exportação que ao mesmo tempo ensejaria a diminuição da importância dos portos argentinos, possibilitando a implementação de novos caminhos para escoar a sua produção interna via Pacífico e, sobretudo, atrairia os países mediterrâneos, principalmente, a Bolívia. [...] continuidade à expansão das fronteiras agrícolas do Centro-Oeste. A Bolívia era o vizinho onde se encontrava a maior faixa de fronteiras que deveriam receber atenção do governo militar brasileiro. E era para onde se dirigia a maioria dos projetos assinados entre os dois países (SOUZA, 2004, p.97). Assim, em
1972 Médici e Banzer encontram-se Corumbá/MS, até então pertencente ao estado de Mato Grosso e assinaram uma declaração conjunta, cujos temas eram: a compra de 1220 barris/dia de petróleo da Bolívia, projetos de cooperação científica e técnica para uso industrial do gás natural e estudos sobre a importação do gás liquefeito do petróleo a partir de 1973, como também, o setor de comunicações constituía-se no tema de maior importância nas discussões entre Brasil e Bolívia. Para a Bolívia isto facilitaria em muito a concretização de projetos básicos para se comunicar com outros países da região, e mesmo com países fora do continente, deslanchando um programa de natureza comercial, de importação e exportação, binômio insubstituível para quem pretende estabelecer relações de integração (SOUZA, 2004, p.99). Dessa forma, para a concretização dos acordos e do projeto de expansão do Brasil através dos corredores de exportação, a atuação brasileira em “território” boliviano foi contundente. Pfrimer (2011) relata que: O governo brasileiro construiu a ligação rodoviária conectando a Plataforma Central de Reserva brasileira a Corumbá no Mato Grosso do Sul, permitindo assim a ligação até Santa Cruz de La Sierra. Posteriormente o governo revolucionário boliviano construiu a auto-estrada ligando Santa Cruz à Cochabamba, o que dava acesso do Porto de Santos até os portos chilenos do Pacífico. Em relação à conexão ferroviária, o governo brasileiro em 1957, terminou a obra da Ferrovia Noroeste ligando Bauru a Corumbá na divisa da Bolívia. Além disso, com os recursos previstos no Tratado de Petrópolis, os governos brasileiro e boliviano decidiram investir na construção da ferrovia ligando Corumbá a Santa Cruz de La Sierra (PFRIMER, 2011, p.137). Durante o governo Geisel (1974-79), a política de expansão do Brasil sobre a América do Sul estava “a todo vapor” e a Bolívia era o grande objetivo do governo brasileiro. A política de atração ocorria, principalmente, porque o governo argentino articulava-se na mesma direção. Por exemplo, por pressões da Argentina e pelas dificuldades em se romper a estrutura natural dos Andes entre Cochabamba e Santa Cruz de la Sierra, foi construído um ramal (sentido norte-sul), ligando
Santa Cruz de la Sierra até Yacuíba (Departamento de Tarija), que se estendeu até o norte da Argentina (GLASNER, 1988). O objetivo da Argentina, assim como do Brasil, era “satelizar” o “território” boliviano. [...] não apenas a ligação viária bioceânica seria o ponto chave da sua política para o subcontinente, mas principalmente a satelitização dos prisioneiros geopolíticos (Bolívia e Paraguai). A finalidade principal era alcançar o Pacífico atraindo boa parte do cerne continental sul-americano e transformando-o na hinterlandia do porto de Santos (PFRIMER, 2011, p.137). Na empreitada pela “satelitização” da Bolívia, o governo brasileiro deu apoio logístico e militar ao golpe liderado por Hugo
Banzer em 1970, posteriormente levando-os a assinarem os “Acordos de Cochabamba” no qual o Brasil se comprometia em construir o gasoduto Brasil-Bolívia (projeto concretizado somente na década de 1990), uma usina petroquímica, uma usina siderúrgica para a jazida de Mutum e uma conexão ferroviária entre Santa Cruz e Cochabamba (MELLO, 1997, p.158/159). As Altas Partes Contratantes, tendo presentes o Tratado de Vinculação Rodoviária, de 4 de abril de 1972, assim como os estudos e obras recomendados no Plano Diretor de Vinculação Rodoviária, acordam em dar tratamento prioritário aos projetos de interconexão entre os sistemas rodoviários brasileiro e boliviano, dentro dos amplos objetivos de criar condições mais favoráveis a uma efetiva integração física entre os dois Países. Esta integração, sobretudo, visava atrair o fluxo de exportações de Santa Cruz de La Sierra para a fronteira na qual se localiza Corumbá/MS, o que possibilitaria a polarização dos fluxos do centro produtor boliviano para o porto de Santos, assim o artigo XII do supracitado tratado concedia à Bolívia quatro zonas francas, entre elas a de Belém, Porto Velho, Corumbá/MS e Santos: Neste contexto confirmava-se o interesse do Brasil pelo gás boliviano. A Bolívia comprometia-se em
fornecer 240 milhões de pés cúbicos diários de gás natural, por um período de 20 anos, o que totalizaria 1,7 trilhões de metros cúbicos (SCHILLING, 1981). Nessa oportunidade, com o projeto de compra do gás (não podemos nos esquecer que o Brasil estava sobre os efeitos da crise mundial do petróleo, assim o gás era de extrema importância) surgiram as primeiras discussões a respeito da implantação do polo industrial na fronteira Brasil/Bolívia, em Mato Grosso do Sul, no lado boliviano, com recursos
financeiros brasileiros (polo que não fora instalado). Evidentemente, boa parte da infraestrutura física fixada para motivos de contenção e exploração dos recursos naturais bolivianos representaram posteriormente um novo desafio às iniciativas de integração, devido à desarticulação proposital dessas redes logísticas pelo confronto geopolítico entre Brasil e Argentina. Exemplos disso são a desarticulação da malha ferroviária boliviana e a escassez de infraestrutura viária comunicando a porção oriental boliviana à ocidental (PFRIMER, 2011, p.138). A infraestrutura desarticulada que surgiu em solo boliviano, em consequência da disputa geopolítica entre Brasil e Argentina nas décadas de 1950, 60 e 70, não somente fora um dos legados dessas sub-potências à Bolívia, mas proporcionaram à última uma herança que
gerou reflexos importantes na porção oriental de seu “território”, sobretudo, em relação às dinâmicas que passaram a ocorrer na fronteira Brasil/Bolívia, na qual se localizam as cidades de Corumbá, Ladário, Puerto Suarez e Puerto Quijarro. 3 – CORUMBÁ/MS: EM DIREÇÃO “AO OUTRO LADO DA FRONTEIRA”Com a “chegada” dos trilhos em 1953, Corumbá/MS passou a desempenhar uma nova função no contexto político-econômico regional, capturando o mercado
consumidor boliviano, a conjuntura expandiu seu comércio atacadista e de exportação, contudo “nos anos 70 perdeu essa posição de importador e de distribuidor de mercadorias no âmbito regional para transformar-se em entreposto exportador” (HANY & HANY, 2007, p.67). [...] as empresas atacadistas de Corumbá alcançaram significativo crescimento (expansão do número de empresas e volume de cargas), até meados dos anos 80. Desde a chegada dos trilhos da Noroeste à cidade, duas zonas atacadistas se firmaram. Ainda nos anos 50, a primeira delas se instalou na região próxima à estação da NOB [ferrovia Noroeste do Brasil], aproveitando a facilidade do contato com a ferrovia. Já nos anos 70, apareceu uma segunda zona atacadista na estrada que liga Corumbá à fronteira com a Bolívia, acompanhando o processo de implantação da rodovia Campo Grande - Corumbá, bem como a franca ascensão do transporte rodoviário no comércio entre o Município e as regiões fornecedoras do Sul/Sudeste (BRITO et al., 1997, p.909). As práticas comerciais intensificam-se, principalmente, pois na cidade de Corumbá/MS as atividades industriais que haviam surgido a partir do final dos anos de 1940 e início dos 50, a partir dos anos de 1970 entraram em crise e encerraram-se. Segundo Marco Aurélio Machado de Oliveira: Por volta dos anos 1950 cidade assistiu a um espetacular esforço de industrialização, promovido, principalmente, por imigrantes de origem árabe. Primeiramente a família Chamma que em 1954 instalou Cia Siderúrgica Sobramil, trazendo em um período inferior a três meses, cinco mil nordestinos para trabalharem como operários na indústria e na extração de madeira. Outro grupo era composto pelos imigrantes: Salim Kassar, João Dolabani, Alfredo Katurchi, Salvador Shib e o descendente de libanês Mamtala Yasbeck. Disso resultaram empreendimentos cujas marcas, algumas em ruínas, resistem ao tempo, como: a Cia de Fiação Matogrossesse, Moinho de Trigo e Curtume Mato Grosso, sendo que no início dos anos 1970, todos esses empreendimentos estavam fechados (OLIVEIRA M. A. M., 2005, p.352). Uma das causas para a derrocada desses empreendimentos industriais relaciona-se ao contato cada vez maior de Corumbá/MS com a produção nacional, sobretudo, porque o uso do transporte rodoviário facilitava o escoamento de outras áreas, fabricantes de produtos similares e mais competitivos, conjuntura que se acentuou em meados dos anos 80, com início da pavimentação da estrada Campo Grande/MS – Corumbá/MS (MICHELS
& OLIVEIRA T. C. M., 1995 apud BRITO et al., 1997). Outro fator que veio a contribuir a intensificação do comércio atacadista em Corumbá/MS no século XX foi a crise nas atividades relacionadas ao setor pecuário. Mesmo o crescimento do rebanho, verificado entre os anos 50/60, não foi suficiente para enfrentar os preços decrescentes da arroba do boi nos mercados consumidores, nos anos 60, o que favorecia os produtores situados em áreas próximas aos centros de abate, no Sul/Sudeste do País. Estes últimos, de outra feita, além de oferecerem vantagem ao comprador, no que se refere aos custos com transporte, comercializavam, em muitos casos, gado gordo, isto é, bovinos de melhor qualidade, já tendo passado pelas fases de cria e recria (BRITO et al., 1997, p.909). A crise do setor pecuário estendeu-se durante os anos de 1970 e 80, quando se adicionou a mesma um novo agravante: as cheias prolongadas na planície pantaneira. Além do fator natural, a pecuária extensiva sofreria já em meados da década de 80, com outro tipo de intervenção, instalaram-se em Mato Grosso do Sul, frigoríficos financiados com capital da região Sudeste, que acabaram provocando transformações no manejo do rebanho, mesmo em áreas da planície pantaneira, como as que existem no município de Corumbá (REBÊLO JÚNIOR, 1995 apud BRITO et al., 1997). Dessa forma: Ao centralizarem a dinâmica regional do complexo agroindustrial das carnes, os frigoríficos incentivam a modernização do manejo do rebanho (pasto plantado, aparecimento de fazendas de engorda, etc.). Muitas destas áreas diferenciadas de manejo, inclusive, são resultantes de investimentos capitaneados por empresários das regiões Sul/Sudeste do País (BRITO et al., 1997, p. 909). Por conseguinte, com
o isolamento gradativo de Corumbá/MS frente aos centros regionais, com os quais manteve intensas relações até os anos 50, como foi o caso de Cuiabá e Cáceres, conjuntura que se intensificou com a divisão do estado de Mato Grosso, em 1979, associada às transformações do complexo agroindustrial de carnes, que facilitaram a incrementação do ciclo completo de beneficiamento da carne bovina; progressivamente a cidade foi afirmando, entre os anos de 1950 e 1970, sua condição de centro regional em
relação às cidades bolivianas, também localizadas nessa Zona de Fronteira. Posteriormente, Corumbá também atraiu capitais daquela região (anos 70 em diante), dadas as facilidades abertas para a importação direta de mercadorias para os centros consumidores do Oriente boliviano. Estes últimos, atraídos pelo acesso vantajoso à infraestrutura rodoferroviária existente no Município, tornaram-se igualmente importantes consumidores de bens e serviços locais, tais como saúde e educação, água potável e energia elétrica, aeroportos, etc. (BRITO et al., 1997, p.910). A partir desse segundo momento, mais especificamente entre o final da década de 1970 e início dos anos 80, de acordo com Oliveira M. A. M. (2005), as transações comerciais entre as famílias árabes em Corumbá e o mercado
boliviano estavam no seu auge, essas relações de comércio foram preponderantes para a consolidação da cidade como centro abastecedor das cidades bolivianas e para a atração de capitais do país vizinho: “pelas ruas do centro da cidade dava gosto de ver pilhas de caixa de produtos brasileiros que eram vendidos para a Bolívia” (OLIVEIRA M. A. M., 2005, p.354). Este processo permitiu, por um lado, o movimento migratório de bolivianos de outras regiões do país para esta região. Entre estes últimos se destacam os ex-mineiros do Altiplano que, ao serem desestatizadas as minas existentes nos Andes, foram incentivados pelo governo boliviano a ocuparem as áreas de fronteira, seja na atividade comercial (shopping-chão), seja como pequenos produtores agrícolas. Uma das conseqüências desta migração foi modificar o perfil da ocupação fundiária na zona oriental, que até então vinha se dando preferencialmente seguindo o traçado da estrada de ferro Puerto Suarez-Santa Cruz de la Sierra (BRITO et al., 1997, p.913). A criação da Província de Germán Busch, englobando essas duas cidades fronteiriças, impulsionou, por parte do governo boliviano, uma série de incentivos fiscais, como também, possibilitou a criação de uma zona de livre comércio (Central Aguirre) no lado boliviano da fronteira, especificamente em Puerto Quijarro. Manetta & Carmo (2011) estudando essa questão, explicam que: Em 1991 a Central Aguirre tornou-se a primeira zona franca de comércio da Bolívia, no município de Porto Quijarro, equipada com porto graneleiro, de hidrocarburos e de cargas em geral. Essa inovação foi seguida pela modernização de outros portos, pelo fortalecimento da rede multimodal de transportes e pela diversificação do comércio e da prestação de serviços na região. (MANETTA & CARMO, 2011, p.7). Dessa forma, uma série de novas interações espaciais passaram a ocorrer em torno dessa região de Fronteira no início da década de 1990. Nas imediações da “divisa” entre Corumbá/MS e Puerto Quijarro, na denominada Arroyo Concepción (distrito da segunda), surgiu uma feira de produtos importados, “O investimento no comércio atacadista e no
transporte de cargas internacional abriu possibilidades para comerciantes de pequeno capital, fato que favoreceu a expansão de um comércio informal e trans-fronteiriço na região” (MANETTA & CARMO, 2011). Juntam-se a esse movimento do outro lado da fronteira comerciantes corumbaenses que lá abrem estabelecimentos. A população da fronteira boliviana cresce a olhos vistos. Ali, aparentemente estava se formando um efervescente pólo comercial, enquanto Corumbá sofria um visível declínio em seu comércio local, com o fechamento da maioria das lojas tradicionais localizadas na Rua Delamare (FLANDOLI, 2007, p.39). Assim, a Zona Franca de Puerto Aguirre, além de proporcionar o surgimento de uma
feira com produtos importados em Puerto Quijarro, com produtos mais baratos e que proporcionariam um declínio nas atividades comerciais atacadistas e posteriormente varejistas da cidade Corumbá/MS, durante a década de 90, na supracitada Zona Franca surgiu um shopping com lojas climatizadas que passaram a oferecer equipamentos eletrônicos, bebidas, perfumes e cosméticos de grandes centros produtores e de marcas mundialmente conhecidas e desejadas (FLANDOLI, 2007, p.40). Intensificando o processo
de deslocamento e instalação de capital do Brasil em direção à Bolívia. [...] às vantagens locacionais dadas pela proximidade com a cidade de Corumbá que, além de centro regional de prestação de serviços, atua como porta de entrada de brasileiros que movimentam o comércio varejista trans-fronteiriço boliviano (MANETTA & CARMO, 2011, p.10). Dessa forma, nessa fronteira o crescimento populacional, com ou sem índices de estagnação, manteve seus vínculos com a mobilidade de pessoas, na qual a circulação populacional transfronteiriça é intensa e cotidiana. O trânsito de bolivianos em Corumbá é facilitado por vários fatores, que vão desde os acordos bilaterais que permitem aos bolivianos morar, trabalhar e estudar no Brasil até ao fato dos imigrantes terem encontrado na zona imediata à fronteira
internacional, inúmeras vantagens locacionais em relação ao mercado de trabalho e ao acesso aos serviços públicos. Assim, o crescimento populacional na supracitada área fronteiriça, conjugada para os bolivianos com as vantagens comparativas de residir na zona imediata à fronteira com o Brasil, sobretudo em Puerto Quijarro, ensejou também assimetrias infraestruturais e socioeconômicas, assim como, as interações espaciais dotadas de mobilidade transfronteiriça, de intercâmbio materiais e imateriais, ocorriam (e ainda acontecem)
circunscritas por lógicas organizacionais distintas (política, social e econômica), que passaram a se chocar. 4- CONSIDERAÇÕES FINAISCom tais pressupostos, é factual que algumas conjunturas protagonizadas e envolvendo os governos de Brasil e Bolívia, ensejaram transformações nas dinâmicas da Zona de Fronteira Brasil/Bolívia, em Mato Grosso do Sul, contribuindo para que a cidade de Corumbá/MS fosse “capturada” pelas cidades bolivianas, principalmente, ao que se refere às atividades comerciais de atacado e varejo. 5 – BIBLIOGRAFIAALBUQUERQUE, J. A. G. Relações Internacionais Contemporâneas: A ordem internacional da Guerra Fria. 2. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. BANDEIRA, M. O Expansionismo Brasileiro e a formação dos Estados na Bacia Platina. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1985. BARAT, J. Logística e transporte no processo de Globalização: oportunidades para o Brasil. São Paulo: UNESP: IEEI, 2007. BRASIL. Ministério da Integração Nacional. 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Brasília: Funag, 2006. 1 Uti posidetis é um princípio do direito internacional segundo o qual o país que ocupa o “território” possui o direito de posse sobre este. Princípio que foi muito utilizado para legitimar e validar conquistas “territoriais”. Portugal e Espanha, por exemplo, adotaram-no para definir as fronteiras de suas colônias na América do Sul. 2 Nesse caso, fazemos alusão ao aspecto físico, simplesmente. Assim, quando nos referirmos ao “território” nesta concepção, sempre o faremos com aspas. Quando utilizarmos território sem aspas, estaremos aludindo ao meio geográfico dotado de relações de poder, definidas pelos ordenamentos jurídicos, pelas questões políticas, econômicas e sociais, por processos de apropriação e dominação. 3 Josef Barat define Rota como “o conjunto de infraestruturas, sistemas operacionais e meios logísticos que, em diferentes escalas e especializações, se integram com o objetivo de propiciar a continuidade do transporte, desde a origem da produção até o destino do beneficiamento, transformação ou embarque” (BARAT, 2007, p.21). O autor também explica que o sentido moderno de rota ou corredor está relacionado ao fortalecimento de sistemas multimodais de transporte, seja na escala regional e/ou de alcance mundial. Ressaltamos que um dos principais equipamentos da mencionada Rota, a rodovia bioceânica (possuindo um percurso que possibilita o acesso aos portos de Santos no Brasil e de Iquique e Arica no Chile) já está praticamente concluída, em vias de ser efetivamente inaugurada em “território” boliviano. 4 Segundo Roberto Lobato Corrêa: “[...] as interações espaciais constituem um amplo e complexo conjunto de deslocamentos de pessoas, mercadorias, capital e informação sobre o espaço geográfico. Podem apresentar maior ou menor intensidade, variar segundo a freqüência de ocorrência e, conforme a distância e direção, caracteriza-se por diversos propósitos e se realizar através de diversos meios e velocidades” (CORRÊA, 1997, p.279). 5 A cidade de Corumbá/MS está localizada na porção oeste do estado de Mato Grosso do Sul (Brasil), e juntamente com Ladário/MS (Brasil) e Puerto Suarez e Puerto Quijarro (Bolívia) compõem a Zona de Fronteira em questão. Área de extrema importância logística para o escoamento de bens circunscritos ao comércio entre Brasil e Bolívia, sobretudo, pois existe uma rede de transporte intermodal nessa fronteira, composta por rodovia, ferrovia, dutovia, hidrovia e aeroporto. 6 Esses adensamentos populacionais apresentam grande potencial de integração econômica e cultural, assim como, as manifestações dos problemas característicos da fronteira, pois são cidades orientadas por legislações de países distintos, com classes sociais que fazem uso do território para além da “linha” de fronteira, com implicações práticas para a atuação do Estado em suas respectivas faixas de fronteira (BRASIL, 2005, p.152). 7 Segundo Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PDFF) as interações fronteiriças não são as mesmas ao longo do extenso limite internacional do Brasil, sobretudo, pois existem diferenças geográficas, os órgãos de Estado atuam de forma particular nos distintos meios geográficos caracterizados como cidades-gêmeas, como também, em cada fronteira estabelecem-se relações cotidianas singulares. Assim, é preciso mencionar que existe uma tipologia para as interações de fronteira, sendo cinco as tipologias propostas: margem, zona-tampão, frentes, capilar e sinapse. De acordo com o PDFF as cidades de Puerto Suarez e Corumbá possuem interações do tipo capilar que se dão somente no nível local, que podem ocorrer “por meio de trocas difusas entre vizinhos fronteiriços com limitadas redes de comunicação, ou resultam de zonas de integração espontânea, o Estado intervindo pouco, principalmente não patrocinando a construção de infraestrutura de articulação transfronteiriça” (BRASIL, 2005, p.144-150). 8 General argentino que foi governador de Buenos Aires, capital da Confederação Argentina, de 1829 a 1832 e num segundo momento entre os anos de 1835 e 1852. Idealizador de uma política externa agressiva, que visava o controle da Bacia Platina, pois a mesma seria fundamental para o projeto de criação de uma Confederação Bioceânica (que incluiria Bolívia, Paraguai e Uruguai) sob a liderança de Buenos Aires. Política que descontentava o Governo Imperial brasileiro, devido ao fato de impedir seu acesso, via os rios do Prata e Paraguai, a Província de Mato Grosso e por ameaçar as fronteiras brasileiras (FERNANDES, R. M. S., 2011, p.24). 9 Além dos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França articulavam-se no continente sul-americano, sobretudo, na Bacia Platina, ora através de acordos comerciais ora intervindo diretamente nas questões geopolíticas do Governo Imperial brasileiro e da Confederação argentina. 10 Ofício n.º 16, de Rodrigo de Souza e Silva Pontes, Enviado Extraordinário Plenipotenciário junto ao governo provisório da Confederação Argentina. Apud: FERNANDES, R. M. S. O segundo ciclo de Kondratiev (1843-1896) e o seu liame com a participação dos Estados Unidos na Guerra do Paraguai. Málaga: Universidade de Málaga, 2011, p.32. Disponível em:<http://www.eumed.net/libros>. 11 Ofício de Cotegipe a Domingos José Gonçalves de Magalhães, ministro do Brasil em Washington. Rio de Janeiro, 25.5.1869, legações imperiais na América, 267- 4 - I, AHI. Apud: FERNANDES, R. M. S. O segundo ciclo de Kondratiev (1843-1896)... Op. Cit. p.29. 12 É preciso ressaltar que fazemos alusão a província de Mato Grosso, que no século XIX, abrangia o “território” dos atuais estados (Unidades Federativas do Brasil) de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, ambos que fazem fronteira com a Bolívia. No século XX as províncias ganharam a condição de unidades federativas (estados), e na década de setenta do mesmo século, o estado de Mato Grosso é divido, para ser mais específico, a partir de 1978, passou a existir o estado de Mato Grosso, cuja capital é a cidade de Cuiabá/MT, e Mato Grosso do Sul, com capital em Campo Grande/MS. 13 O rio Paraguai atravessa o “território” paraguaio até se encontrar com o rio Paraná, já em terras argentinas, para então formar o rio do Prata que desemboca no Oceano Atlântico. Dessa forma, para se chegar do Rio de Janeiro a Província de Mato Grosso via hidrovia era preciso percorrer os “territórios” argentino, uruguaio (águas territoriais do foz do rio do Prata) e paraguaio. 14 Decreto nº 862, de 16 de outubro 1890. Disponível em:<http://www.senado.gov.br/legislacao/>. Acesso em: 15 jan. 2012, p.1. 15 A perspectiva realista é aquele em que o Estado tem como objetivo a sua própria sobrevivência e o principal instrumento para garanti-la é a guerra. Dessa forma, articula-se no contexto internacional com métodos relacionados ao emprego da força militar. Esta perspectiva contrapõe-se ao método idealista (ou liberal), cujo intuito é superar os conflitos por meio da cooperação estatal, tentando garantir a paz (ALBUQUERQUE, 2007, p.30-32). 16 A derrota da Bolívia frente ao Paraguai na Guerra do Chaco (1932-1935) ensejou à etapa de transformações políticas que culminou com a Revolução de 1952, o maior movimento revolucionário da história da Bolívia republicana. O destaque nesse período de transição foi o socialismo autoritário e nacionalista de governos militares de David Toro (1936 - 1937), Gérman Bush (1937-1939), Guillermo Villarroel (1943-1946). Gestões pautadas pelo intervencionismo estatal que impelidos pela forte mobilização social ruiu às bases das oligarquias (TEIXEIRA, 2009, p.34/5). 17 Fazemos alusão ao I Plano Nacional de Desenvolvimento – I PND (1972-74) instituído durante o governo Emílio Garrastazu Médici (1969-74). Que características peculiares a Bolívia apresenta quando o seu território?Não possui em seu território litoral marítimo. É em seu território que a cordilheira dos Andes atinge largura máxima (650 quilômetros). É também onde se localizam o árido altiplano andino e as principais cidades, como La Paz, a capital mais alta do mundo, com 3.636 metros de altitude.
O que falar sobre a Bolívia?Bolívia é um país de 11 milhões de habitantes localizado na porção andina da América do Sul. Sua economia é baseada na exploração de combustíveis fósseis, como gás natural. Bandeira da Bolívia. Bolívia, ou Estado Plurinacional da Bolívia, é um país sul-americano localizado na região conhecida como América Andina.
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