Tenho a guarda do meu filho posso mudar de país

Doutor, eu me separei do meu marido. Eu vou pegar as crianças e morar em outro estado. Posso? ”

Esse tipo de situação é comum entre as mulheres, já que culturalmente são mais próximas aos filhos e representam a parte mais frágil da equação. Contudo, a verdade é que isso pode acontecer também com os papais, apesar de não ser algo tão corriqueiro. Mas se esse é o seu caso, o artigo vale para você também. Não se trata de discriminação, como já me perguntaram por aqui (e eu entendo perfeitamente!), mas apenas uma forma de fazer com que a informação chegue para você da maneira que se adeque mais ao seu caso.

Dito isto, vamos enfrentar o problema.

Quais as consequências de levar o filho para outra cidade ou estado?

É uma questão difícil porque envolve uma situação delicada chamada Alienação Parental, que merece tratamento específico. Esse conceito é algo muito relevante por conta de dois reflexos principais.

Primeiro, isto pode ser considerado crime, dependendo das características do caso concreto. É que isso seria uma forma de violência psicológica, que por sua vez pode gerar a aplicação das medidas protetivas da Lei Maria da Penha (Lei 13.431/2017, art. 4º, II, "b" e art. 6º). Em caso de desobediência desta medida, além de prisão preventiva (LMP, art. 20), quem comete alienação parental estará cometendo também crime de desobediência (LMP, art. 24-A, acrescentado pela Lei 13.641/18). A alienação parental, ao menos do ponto de vista técnico, pode realmente dar cadeia.

O segundo aspecto é que essa atitude tem repercussão direta nadeterminação da guarda da criança. A constatação de alienação parental pode gerar a inversão da guarda, e não só porque a atitude prejudica o outro genitor, mas principalmente porque isso tem consequências graves para a própria criança.

Portanto, é de extrema importância verificar se a atitude de levar a criança para outra cidade ou estado, sem autorização da justiça ou do pai (ou mãe, se for o caso), pode ser considerada alienação parental. O que os tribunais têm decidido a respeito?

Toda situação de levar a criança para morar longe tem a mesma resposta?

Antes de iniciar a análise, é importante que você saiba que cada caso é um caso. Não há fórmula pronta e não tem tamanho único. Nenhum Juiz ou Tribunal irá olhar para o rótulo do caso, apertar um botão e ver saltar uma regra já estabelecida para colocar na sentença. Cada caso tem suas peculiaridades e o que vai ser decidido judicialmente tem a ver com as características de seu problema.

Não pense também que esse artigo irá dar a resposta para o seu caso específico, porque o que digo aqui não serve para todas as situações. Estou apenas fornecendo informação que depende em grande parte dos detalhes de seu caso. Pode ser que, para a sua situação, tudo isso se adeque como uma luva. Mas pode ser que não sirva.

Se preferir, assista aqui meu vídeo sobre esse mesmo assunto: 

 Mario Solimene fala sobre as mães que levam crianças para morar em outro estado

Afinal, levar a criança embora é alienação parental?

Voltando ao ponto: a mãe levar os filhos para outro estado ou cidade é alienação parental? Como regra geral, a tendência é a resposta “sim”, pois isso irá afastar o pai das crianças e impedir a convivência. Mas há algo que possa fazer essa conclusão perder a força?

A resposta também é sim, e envolve normalmente duas situações.

É compreensível que as pessoas não devem permanecer como reféns de uma situação, presas eternamente a uma armadilha inevitável. Se a mãe está sozinha, abandonada com as crianças, ela tem o direito de buscar melhores condições de sobrevivência para si e para a prole, afinal de contas seu direito de ir e vir está preservado.

Quais são essas duas situações que não geram alienação parental?

Primeiro, se você tem família em uma outra localidade, há a tendência dos Tribunais em compreenderem que a rede familiar de proteção às crianças será melhor na sua cidade de origem. Vamos supor que a mãe é de uma cidade do interior do Estado de Minas Gerais, e que foi trazida pelo marido ou companheiro para uma cidade do interior de São Paulo. Depois de alguns anos o casal tem filhos, mas acaba se separando. A mãe deve continuar sozinha com as crianças, sem apoio de ninguém e em um ambiente hostil? Isso seria algo extremamente prejudicial, tanto para as crianças quanto para a própria mãe, e é natural que ela pense em retornar à sua cidade de origem – afinal, lá poderá ao menos contar com o apoio de seus pais e familiares. Os Tribunais são sensíveis a essa situação, principalmente porque não seria razoável exigir o contrário, sob pena de prejuízo ao melhor interesse das crianças. Diante disso, há uma boa chance de que a partida com os filhos não seja considera alienação parental. Mas vale relembrar que, como dito antes, cada caso é um caso e deve ser analisado de acordo com suas características.

A segunda a situação é de caráter econômico. Se a mãe não tem possibilidade alguma de manter-se na cidade em que está, pois não há como conseguir um emprego para sustentar seus próprios filhos e não conta com apoio de ninguém, o caminho natural seria escapar dessa situação. Ela pode decidir sair para uma outra cidade em que tenha recebido uma proposta de emprego, ou em que conte com possibilidades reais de recolocação no mercado de trabalho. A separação causou uma mudança profunda na situação e que demanda uma atitude para garantia de sobrevivência. Aqui também há uma tendência dos Tribunais em analisar a questão sob uma ótica relativamente favorável a quem viu-se compelido a mudar de cidade.

Tenho a guarda do meu filho posso mudar de país
 

Qual é a situação clássica de alienação parental na mudança de estado ou cidade?

Para finalizar a discussão, é preciso verificar a situação clássica de alienação parental. O que não pode acontecer é uma atitude deliberadamente voltada contra o pai, mas sem consequência prática ao bem estar dos filhos. Como exemplo, temos o caso da pessoa que se separa, tem as crianças consigo mas não quer que o outro genitor tenha contato com os filho. Em função disso escolhe sair na calada da noite e muda para um lugar distante, justamente para evitar o contato paterno. Esta é a definição clássica da Alienação parental, com consequências graves. É claro que nem toda análise é simplista assim, e é evidente que qualquer caso poderá gerar nuances positivas e negativas. Mas isso lhe dá uma ideia do que não é permitido e do que é justificável.

No seu caso específico, o melhor a fazer é consultar sempre um advogado antes de tomar uma atitude, mesmo porque os detalhes de sua situação – como visto – importam muito. Havendo necessidade de partida para outra cidade, o advogado poderá avaliar estrategicamente se o caso é de solicitar uma autorização judicial para a mudança ou de deixar que os eventos se desenrolem naturalmente para tomar uma atitude em juízo depois, provavelmente na situação de defesa contra a reação do outro genitor.

Alienação parental é algo sério que merece ser tratado com muito cuidado.

Quando a mãe tem a guarda do filho pode mudar de pais?

É necessário ingressar com uma ação judicial solicitando a permissão. Além disso, o genitor que irá residir em outro país com o filho deve comprovar a razão da mudança e dar garantias que a criança terá proteção integral na nova morada.

Quem tem a guarda pode sair do pais?

Mesmo que você tenha a guarda do seu filho, seja ela unilateral ou compartilhada, nas viagens internacionais o outro genitor precisa autorizar a viagem, expressamente, através de documento com firma reconhecida em cartório.

O que fazer se o pai não autoriza o filho morar fora?

Quando há negativa de autorização para a viajar é plenamente possível mover a Ação de Suprimento Judicial para viagem internacional de menor. Esse tipo de ação é muito comum e deve ser proposta na Vara de Infância e Juventude com pedido de tutela de urgência para deferimento do Alvará autorizativo.

Como levar o filho para morar no exterior?

Se a criança ou o adolescente morar no exterior, não precisa autorização, desde que comprove o local da residência, por meio de Atestado de Residência emitido há menos de dois anos por Repartição Consular Brasileira, e desde que viaje com um dos pais. Se não estiver com os pais, é preciso autorização destes.