Por que a pandemia exerceu uma influência tão grande sobre a economia?

Impactos sociais, econômicos, culturais e políticos da pandemia

A pandemia de Covid-19, causada pelo vírus SARS-CoV-2 ou Novo Coronavírus, vem produzindo repercussões não apenas de ordem biomédica e epidemiológica em escala global, mas também repercussões e impactos sociais, econômicos, políticos, culturais e históricos sem precedentes na história recente das epidemias.

A estimativa de infectados e mortos concorre diretamente com o impacto sobre os sistemas de saúde, com a exposição de populações e grupos vulneráveis, a sustentação econômica do sistema financeiro e da população, a saúde mental das pessoas em tempos de confinamento e temor pelo risco de adoecimento e morte, acesso a bens essenciais como alimentação, medicamentos, transporte, entre outros.

Além disso, a necessidade de ações para contenção da mobilidade social como isolamento e quarentena, bem como a velocidade e urgência de testagem de medicamentos e vacinas evidenciam implicações éticas e de direitos humanos que merecem análise crítica e prudência.

Partindo-se da perspectiva teórica de que as enfermidades são fenômenos a um só tempo biológicos e sociais, construídos historicamente mediante complexos processos de negociação, disputas e produção de consensos, objetivo das atividades deste eixo envolve compreender e responder parcialmente aos desafios colocados pela pandemia, organizando uma rede de pesquisadores do campo das ciências sociais e humanidades visando a investigação, resposta e capacitação como estratégias para o enfrentamento do Covid-19 no Brasil.

Este eixo do Observatório Covid-19 possui três subeixos, que abordam temas centrais para o entendimento dos impactos sociais, econômicos, culturais e políticos da pandemia:  "Covid nas favelas", "Saúde indígena" e "Ética e bioética". 

Tempo de leitura: 6 minutos(Atualizado em: 8 de julho de 2020)

Primeiros resultados do desempenho econômico são desastrosos e indicam que o país podem amargar mais prejuízos em 2020 

O Brasil se tornou o novo epicentro da pandemia do novo coronavírus somando mais de meio milhão de pessoas diagnosticadas com COVID-19, segundo os dados divulgados pelo Ministério da Saúde. O número exponencial de casos da doença e vidas interrompidas dividem espaço com os resultados negativos da economia brasileira e as tensões no cenário político. Com essa crise, alguns economistas acreditam que o país caminha para a recessão no próximo semestre.

A economia brasileira já caminhava a passos lentos rumo à recuperação, mas a pandemia transformou todo otimismo em projeções sombrias, ampliando as desigualdades e provocando um ambiente de muita insegurança. 

Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, avalia que existem um conjunto de fatores que podem jogar a economia para baixo. “A herança dessa pandemia faz com que as pessoas reduzam o consumo por receio do agravamento da situação econômica que pode, por exemplo, resultar em desemprego e um cenário ainda mais caótico do que enxergávamos inicialmente. Por isso, muitos estão travando o consumo para contingenciar os recursos e conseguir se manter nesse período de incerteza”, afirma. 

O tombo da economia brasileira em números

PIB em queda 

A retração de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional no primeiro trimestre de 2020, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), reflete os impactos da pandemia do novo coronavírus na economia brasileira. O número representa o menor resultado desde o segundo trimestre de 2015, quando o indicador caiu -2,1%. 

Os dados do IBGE apontam ainda que o recuo na economia foi motivado pela queda de 1,6% nos serviços – setor que configura 74% do PIB brasileiro –, a indústria encolheu -1,4% e a agropecuária cresceu 0,6%. Já o consumo das famílias, que representa 65% do produto interno bruto, caiu 2% enquanto o do governo teve expansão de 0,2%. 

O PIB é a soma de todos os bens e serviços produzidos pelo país em determinado período. É um indicador importante para saber se a economia cresceu, encolheu ou se manteve estável. 

O relatório Focus, divulgado pelo Banco Central (BC) semanalmente, reúne as expectativas de economistas para os principais indicadores do País. Na divulgação de 1º de junho, os economistas de mais de 100 instituições financeiras estimavam um encolhimento de 6,25% no PIB brasileiro em 2020. 

Apesar de o Brasil ultrapassar 60 mil mortes por COVID-19, alguns estados iniciaram os planos de flexibilização da quarentena para permitir a retomada de comércios e outros serviços não essenciais. 

“No cenário que se desenha atualmente, as pessoas vão voltar em partes e talvez não tenham os mesmos hábitos do passado porque elas voltam com grande incerteza sobre o futuro. Portanto, o consumo e a produção serão menores,” diz Inhasz. 

Desemprego subindo 

O número de pessoas desempregadas subiu e chegou a 12,8 milhões (12,6%) no trimestre concluído em abril – 898 mil a mais do que o trimestre anterior – , segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE. O levantamento aponta que o Brasil bateu recorde com 5 milhões de desalentados – pessoas que desistiram de procurar emprego.

Em março, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS)  decretou pandemia e o Brasil registrou a primeira morte pela COVID-19, os governos adotaram medidas de isolamento social para tentar conter a propagação do novo coronavírus.  Com isso, comércios e serviços não essenciais tiveram que interromper as atividades ou tiveram drástica redução da demanda. 

A ação teve um resultado devastador no mercado de trabalho brasileiro que, entre março e abril, fechou 1,1 vagas com carteira assinada em decorrência da pandemia do novo coronavírus, apontam dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Outros 8,1 milhões de trabalhadores tiveram contrato suspenso ou redução de salário e jornada – com respaldo da Medida Provisória 936 –, segundo o Ministério da Economia. 

Por que a pandemia exerceu uma influência tão grande sobre a economia?

Aumento da desigualdade

Embora ainda não existam dados oficiais sobre o período da pandemia, o profundo abismo da desigualdade impede que muitas famílias de baixa renda cumpram o isolamento social recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A taxa de isolamento no Estado de São Paulo foi de 47% em 1º de junho – quando o ideal seria 70% – , de acordo com o Sistema de Monitoramento Inteligente do governo. Na Capital, o índice foi de 49%. 

“Quem consegue se proteger nesse momento são as pessoas que tem uma qualificação maior, com emprego formal, possibilidade de fazer trabalho remoto e que entraram nessa pandemia numa posição mais privilegiada”, afirma Inhasz. 

Pessoas que não tem esse perfil e geralmente moram nas periferias precisam deixar suas casas e utilizar o transporte público para assumir os postos de trabalho, muitas vezes, nos serviços essenciais, como supermercados e farmácias. Outros trabalhadores, no entanto, buscam a informalidade para conseguir o sustento da família. 

Nadja Heiderich, professora de economia da Fecap, alerta que as pessoas com baixa renda, na maioria das vezes, não possuem reserva de emergência para se proteger da crise. “Com a redução da renda, os gastos serão direcionados para garantir a sobrevivência podendo causar o endividamento com altas taxas de juros”, diz.  

Em maio, o percentual de famílias que se declararam endividadas ficou em 66,5%, segundo Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), divulgada pela Confederação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). 

Enquanto muitos trabalhadores precisam se arriscar para conseguir colocar comida em casa, dados do IBGE apontam que o 1% mais rico da população – formada por 2,1 milhões de pessoas – obteve rendimento médio mensal de R$ 28.659 no ano passado, que equivale a 33,7 vezes a renda da metade da população brasileira mais pobre, que ganhava R$ 850. Com os impactos causados pela crise do novo coronavírus, a disparidade pode aumentar. 

Segundo Inhasz, a desigualdade de renda em meio à pandemia mostra que não estamos todos no mesmo barco. “Estamos no mesmo mar, mas os barcos são bem distintos. Algumas pessoas estão em um bote e outras em um transatlântico. Todo mundo está sofrendo do mesmo tsunami, mas tem gente que consegue aguentar muito mais fácil do que outros”, destaca. 

Encolhimento da produção industrial 

A pandemia do COVID-19 derrubou o setor industrial em 18,8% em abril, na comparação com mês de março, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com a queda, a produção ficou 38,3% abaixo de pico histórico no Brasil. 

O tombo impactou 22 dos 26 setores econômicos, com destaque para a produção de veículos automotores, reboques e carrocerias que caiu 88,5%, na comparação com março e 92,1% na avaliação anual. 

O encolhimento também afetou as categorias de couro, artigos para viagem e calçados (-48,8%), bebidas (-37,6%), confecção de artigos do vestuário e acessórios (-37,5%), máquinas e equipamentos (-30,8%) e produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-18,4%).

Por outro lado, o setor industrial registrou crescimento nos produtos alimentícios (3,3%) e produtos farmoquímicos e farmacêuticos (6,6%). Ademais, a produção de perfumaria, sabões, produtos de limpeza e de higiene pessoal subiu (1,3%). 

Risco-país elevado

Para o investidores estrangeiros, o Brasil não é um país seguro para investir recursos. A constatação vem do Credit Default Swap (CDS) – indicador internacional de risco de calote dos países –, que alcançou a marca de 270 pontos em 27 de maio de 2020. O número está bem abaixo dos 372 pontos registrados em 27 de abril, mas ainda acima dos 98,9 pontos do dia 1 de janeiro. 

Na avaliação de Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, o indicador reagiu ao risco fiscal de longo prazo. “Encerramos 2019 acreditando que teríamos um descanso desse tema nos próximos anos, mas vemos que a falta de diálogo entre o Congresso e o Planalto rapidamente abriram margem para projetos que têm impacto fiscal recorrente prosperarem”, diz.

Segundo Cruz, a crise do coronavírus e o Plano Pró-Brasil também mostraram que não existe alinhamento entre os ministros e a condução de política econômica.

“Morando no Brasil já é complicado acompanhar todo o desdobramento das inúmeras crises políticas, para um estrangeiro menos familiarizado isso fica ainda mais complexo. O risco-país lhe dá alguma direção, junto com as notas das agências de rating, do quadro atual local. Assim, essa piora na imagem brasileira afasta recursos de estrangeiros e sem esse fluxo teremos um crescimento menor nos próximos anos”, explica. 

O Brasil caminha para a recessão?

O temor da recessão econômica ronda o país e os economistas acreditam que o Brasil pode viver períodos mais amargos a partir do segundo semestre. Para que isso aconteça, é necessário ter dois trimestres de queda consecutiva no PIB. Assim, no jargão econômico, temos a recessão técnica. 

Inhasz argumenta que a recessão em si é um conceito econômico. “Pode acontecer, por exemplo, de não ter recessão técnica, mas ter uma queda tão brusca em algum período que isso já começa sinalizar as possibilidades de recessão”, explica. 

Ela acredita que o PIB deve ter uma queda brusca no meio do ano. “Abril e maio que foram meses amargos, junho também será difícil e talvez não seja caracterizado como recessão técnica, mas sensação será nítida com os comércios fechando e o desemprego subindo de uma forma agressiva”, finaliza. 

Como a economia brasileira foi afetada pela pandemia?

O déficit para 2022 é estimado em 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB), ante 1,1% em 2021, antes 10% em 2020 (ano de elevados gastos, necessários para conter os impactos da pandemia). Já o endividamento público caiu para 19,2% do PIB este ano e chegará a 18% em 2022.

Quais os efeitos das pandemias na economia mundial?

A crise gerou impactos dramáticos na pobreza e na desigualdade globais. A pobreza global aumentou pela primeira vez em uma geração, e as perdas desproporcionais de renda entre as populações desfavorecidas levaram a um aumento drástico da desigualdade entre os países e dentro deles.

O que a pandemia impactou?

Os efeitos da pandemia variam amplamente e incluem desde impactos diretos na economia e empregos até efeitos indiretos de perdas de aprendizagem entre crianças que estão fora da escola. O Brasil está entre os países mais afetados pela pandemia da COVID-19.

Como a pandemia impactou o mundo?

A pandemia de Covid-19, causada pelo vírus SARS-CoV-2 ou Novo Coronavírus, vem produzindo repercussões não apenas de ordem biomédica e epidemiológica em escala global, mas também repercussões e impactos sociais, econômicos, políticos, culturais e históricos sem precedentes na história recente das epidemias.