Cildo Meireles (Rio de Janeiro RJ 1948)Artista multimídia. Cildo Campos Meireles iniciou seus estudos em arte em 1963, na Fundação Cultural do Distrito Federal, em Brasília, orientado pelo ceramista e pintor peruano Barrenechea (1921). Começa a realizar desenhos inspirados em máscaras e esculturas africanas. Em 1967, transfere-se para o Rio de Janeiro, onde estuda por dois meses na Escola Nacional de Belas Artes (Enba). Nesse período, cria a série Espaços Virtuais: Cantos, com 44 projetos, em que explora questões de espaço, desenvolvidas ainda nos trabalhos Volumes Virtuais e Ocupações (ambos de 1968-1969). É um dos fundadores da Unidade Experimental do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ), em 1969, na qual leciona até 1970. O caráter político de suas obras revela-se em trabalhos como Tiradentes - Totem-monumento ao Preso Político (1970), Inserções em Circuitos Ideológicos: Projeto Coca-cola (1970) e Quem Matou Herzog? (1970). No ano seguinte, viaja para Nova York, onde trabalha na instalação Eureka/Blindhotland, no LP Sal sem Carne (gravado em 1975) e na série Inserções em Circuitos Antropológicos. Após seu retorno ao Brasil, em 1973, passa a criar cenários e figurinos para teatro e cinema e, em 1975, torna-se um dos diretores da revista de arte Malasartes. Desenvolve séries de trabalhos inspirados em papel moeda, como Zero Cruzeiro e Zero Centavo (ambos de 1974-1978) ou Zero Dólar (1978-1994). Em algumas obras, explora questões acerca de unidades de medida do espaço ou do tempo, como em Pão de Metros (1983) ou Fontes (1992). Em 2000, a editora Cosac & Naify lança o livro Cildo Meireles, originalmente publicado, em Londres em 1999, pela Phaidon Press Limited. Participa das Bienais de Veneza, 1976; Paris, 1977; São Paulo, 1981, 1989 e 2010; Sydney, 1992; Istambul, 2003; Liverpool, 2004; Medellín, 2007; e do Mercosul, 1997 e 2007; além da Documenta de Kassel, 1992 e 2002. Tem retrospectivas de sua obra feitas no IVAM Centre del Carme, em Valência, 1995; no The New Museum of Contemporary Art, em Nova York, 1999; na Tate Modern, em Londres, 2008; e no Museum of Fine Arts de Houston, 2009. Recebe, em 2008, o Premio Velázquez de las Artes Plásticas, concedido pelo Ministerio de Cultura da Espanha. Em 2009, é lançado o longa-metragem Cildo, sobre sua obra, com direção de Gustavo Moura. Comentário CríticoCildo Meireles é reconhecido como um dos mais importantes artistas brasileiros contemporâneos. Aos 10 anos de idade muda-se para Brasília, onde tem contato com a arte moderna e contemporânea. A partir de 1963, estuda com Barrenechea e acompanha a produção artística internacional por livros e revistas. Nesse momento, se impressiona com a coleção de máscaras e esculturas africanas da Universidade de Dacar, exposta na Universidade de Brasília (UnB).1 Por meio de publicações, conhece o Grupo Neoconcreto, do Rio de Janeiro. Sente-se atraído pelo movimento e se interessa pela possibilidade aberta pelo grupo "de pensar sobre arte em termos que não se limitassem ao visual".2 No entanto, diferentemente daqueles artistas, seu trabalho, na época, é gestual e figurativo - um desenho de natureza expressionista. Em 1967, muda-se para o Rio de Janeiro. Nesse ano, o desenho passa para segundo plano, e o artista abandona a figuração expressionista, voltando-se para obras tridimensionais. Sua primeira instalação é Desvio para o Vermelho, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ), em 1967. Cria os Espaços Virtuais: Cantos (1967-1969), fragmentos de ambientes em que dois planos se cruzam abrindo uma fresta entre eles. Em 1970, participa da exposição coletiva Information, no Museum of Modern Art (MoMA), de Nova York. A mostra reúne boa parte da produção de matriz conceitual da década de 1960. Cildo Meireles leva as Inserções em Circuitos Ideológicos (1970), série de trabalhos em que imprime frases subversivas em cédulas de dinheiro e garrafas de Coca-Cola, deslocando a recepção da obra da dimensão de "público" para a de "circuito". A intervenção política em objetos banais é constante em sua produção entre 1970 e 1975, como Árvore do Dinheiro (1969), Introdução a uma Nova Crítica (1970) e O Sermão da Montanha: Fiat Lux (1973). Mora nos Estados Unidos de 1971 até 1973. Ao retornar ao Brasil, concentra-se nas linguagens conceituais e na apropriação de objetos não-artísticos. Em 1974, termina a primeira versão do trabalho Malhas da Liberdade (1976). Realiza, em 1975, a instalação Eureka/Blindhotland, em que investiga propriedades sensoriais não visuais dos objetos utilizados. Na segunda metade da década de 1970, amplia essa discussão em esculturas como A Diferença entre um Círculo e uma Esfera É o Peso (1976), Estojo de Geometria (1977) e Rodos (1978). No início da década de 1980, alguns elementos pictóricos são incorporados às suas instalações e esculturas, como em Volátil (1980), Maca (1983), Cinza (1984) e Para Pedro (1984). Realiza Missão/Missões (1987), instalação feita com hóstias, moedas e ossos, e Através (1989), um ambiente labiríntico formado por objetos e materiais utilizados para delimitar ou interditar espaços, como grades e alambrados. Em 2001, realiza Babel, instalação sonora e luminosa feita com rádios sintonizados em diferentes estações, que retoma e atualiza seus trabalhos com discos de vinil da década de 1970. É o segundo artista brasileiro a ter uma exposição retrospectiva de sua obra na Tate Modern, em Londres, em 2008. No ano anterior, a instituição realiza uma mostra dedicada a Hélio Oiticica. Notas Críticas"Esses três registros através dos quais foi pensado o Desvio para o Vermelho - Impregnação, Entorno, Desvio - constituem, na verdade, calculados simulacros de normalidade, onde o sujeito inutilmente desperdiçará seus afetos miméticos. Cada uma das etapas é um esforço rigoroso e persistente para evitar o reconhecimento do sujeito num real concebido como espelho, evitar o triunfo das certezas institucionais a produzirem o mundo como um encadeamento sucessivo de causas e efeitos, de meios e fins. Daí o primeiro trabalho de Impregnação, impondo o vermelho como exigência inelutável à percepção, a um só tempo expondo e recolhendo a normalidade. (...) Logo a seguir, no Entorno, talvez se acredite estar livre desta incômoda normalidade, talvez se acredite já haver detectado o elemento desviante, agora devidamente controlado num pequeno frasco. Falso encadeamento de termos, não se consegue demarcar a amplitude do desvio: o vermelho, agora liquefeito, verte incontinente do frasco, um fluxo absurdamente maior do que a capacidade do recipiente. (...) Talvez a resolução estivesse na etapa seguinte; descobriu-se aqui a origem daquele fluir implausível, a explicação, afinal: uma pia, uma torneira. O que seria muito verossímil, se o sujeito não estivesse completamente imerso na escuridão, se aquela pia, com seu contínuo jorro vermelho, único índice que poderia garantir ao menos a vigência das coordenadas espaciais, não estivesse ligeiramente inclinada, indicando que talvez esse espaço não lhe garanta mais nada. (...) Mas, note-se bem, do ponto de vista do
sujeito trata-se de uma situação extremamente lábil: há algo no desvio que pode, de um momento a outro, convertê-lo em normalidade, e, inversamente, há algo nessa normalidade prestes a tornar-se desvio". "Penso que através das noções da física, da economia e da política, expressando e especificando a interação concreta das forças dessas esferas, Cildo vem atualizando e determinando a legitimidade dos impulsos críticos associados a Duchamp. (...) No seu trabalho, física, economia e política não representam apenas níveis infra ou supraestruturais, hierarquias, planos distintos, mas um complexo de vetores que agem em conjunto, ora em sincronia, ora disassociados, freqüentemente em contradição. Este complexo tem o nome de Sociedade. No limite exprimiria o insolúvel conflito entre o sem limites do espírito e a escassez da matéria, o drama concreto do ilimitado e do limitado. (...) A física constitui o nível infra-estrutural onde a constante é a lei da gravitação universal; é o mundo da força, massa, peso, velocidade, aceleração, da homogeneidade do tempo e do espaço que a experiência social coloca em questão (Blindhotland). A economia é a esfera da produção, do valor, da circulação, a política do poder. O trabalho acompanha as 'passagens', os 'saltos' de uma esfera à outra, a transposição de um plano a outro, registrando e especificando mudanças, deformações, continuidades. Aí nada permanece estático; o movimento e a circulação são incessantes e o trabalho apresenta 'momentos' dessa dinâmica permanente. (...) Os Metros II de Cildo rejeitam a unidade fixa. Constituem um fluido em alteração contínua, dialética entre a extensão abstrata e a dura atual e concreta das coisas. Não é por acaso que os vários trabalhos da série estão na parede. Referem-se ao local tradicional da representação, à perspectiva linear em que o fenômeno do esforço pode fazer tanto a unidade metro coincidir consigo mesma quanto se reduzir ao ponto - infinito. É o 'salto' ilusório do mensurável ao não-mensurável, que a representação arma e os Metros II desarmam. (...) Com os caixotes - Ouro e Paus é o título do trabalho - estamos na esfera da produção, do valor e da circulação. Tal como os Metros II também representam limites,
agora tridimensionais. São caixas vazias, continentes sem conteúdo. Inúteis. O valor não está naquilo que porventura venhamos a encontrar no seu interior. O interior é o nada. O valor está no exterior, o próprio caixote é o valor. No elemento desprezível, o prego, encontramos o ouro. Essa série também tenderia para o infinito, onde poderíamos encontrar o caixote derradeiro, metafísico e ainda possível; aquele feito com o último e único prego existente, onde a escassez coincidiria com o valor
supremo, assim como Deus, se ele existe, só pode ser um". "Não constitui novidade afirmar que a investigação de Cildo Meireles sempre esteve associada a imagens de forte conotação simbólica. Vários críticos exploraram o valor de
resistência dessa obra, localizada nos anos 70 como 'arte experimental de vanguarda', expressão que já trazia em suas filigranas a efígie das ditaduras militares, que não somente tomaram o poder no Brasil, como se expandiram por muitos países da América Latina. As poderosas metáforas construídas pelo artista, ao longo de uma trajetória de trinta anos, tinham como pano de fundo a busca de uma consciência identitária. Sobre a 'brasilidade', Cildo pronunciou-se com firmeza, afirmando tratar-se
antes de uma ansiedade do que de uma questão. É fato que, do Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade, até as proposições neoconcretas de Lygia Clark e Hélio Oiticica, a procura de uma identidade tem sido uma pauta reivindicatória. Mas a pesquisa formal não poderia ficar à margem dessa discussão, e o argumento mais utilizado,
tanto no Brasil como na lente do 'estrangeiro', tem sido o da cor (diferente em Tarsila do Amaral e Volpi, por exemplo), capaz de assumir inúmeros adjetivos: telúrica, expansiva, idealista, tropical etc. " "Em toda a obra de Cildo Meireles, há uma constante manifestação de tensão e torção - seja no âmbito da estética, percepção, ciência ou economia. Centrando-se em nossa experiência desses diferentes ramos do conhecimento, sua arte visa gerar novos significados por meio do reconhecimento dos limites e falibilidade desses sistemas de compreensão. (...) Desde o fim dos anos 60, Cildo Meireles tem desempenhado papel-chave na transição da arte brasileira entre a produção neoconcretista do início dos anos 60 - Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape - e a de sua geração, informada também pela arte conceitual e instalação. Embora sua obra tenha se desenvolvido dentro da tradição brasileira, ela não se refugia no regionalismo nem renuncia a afiliações à cultura ocidental. Sua arte situa-se na relação de fricção entre questões sociais e poéticas específicas do Brasil e a herança do Ocidente. Para Cildo, os trabalhos de Marcel Duchamp são tão importantes como os de Oiticica, como modelos de problematização da arte. (...) A obra
de Cildo poderia ser descrita como uma teoria poética da sociedade. Ela coloca questões que vão da política a ideais e estratégias. Examina espaços e processos de comunicação, as condições do espectador, os legados da história da arte e o espaço social do gueto - espaço freqüentemente evocado. O foco de sua arte pode abranger desde a expansão econômica do capitalismo internacional a um pequeno gesto cultural de índios brasileiros. Seus trabalhos não têm hierarquia de escala ou consistência de
materiais, variando de uma diminuta escultura que consiste em um minúsculo cubo de madeira, Cruzeiro do Sul (1969-70), à instalação com ares de templo que incorpora centenas de milhares de moedas, Missão/Missões (Como Construir Catedrais, 1987). Podem incorporar gestos, fogo, espaço, coisas, circuitos sociais, linguagem, som, acumulação, potência, distância, energia. A arte de Cildo dispensa gestos heróicos para privilegiar simples ações cotidianas, como dobrar um pedaço de papel (A Menor
Distância entre Dois Pontos É Uma Curva, 1976), atear fogo (Tiradentes: totem-monumento ao preso político, 1970) ou trocar dinheiro (Eppur si Muove, 1991). A obra é concebida e estruturada em torno de um ponto nodal em que o Real, o Simbólico e o Imaginário se articulam e encontram sua medida". Depoimentos"Sempre que tentamos definir arte, confrontamos as divisões entre o que é e o que não é considerado objeto de arte. Em tempos pré-clássicos, arte e religião eram sinônimos. Na Grécia clássica, arte e arquitetura estavam igualmente ligadas. Mais tarde foi criada uma distância entre o artístico e o arquitetônico. A arte passou a ser vista como a documentação ou reprodução do real, e assim por diante. O que me atraiu no neoconcretismo foi a possiblidade de pensar sobre arte em termos que não se limitassem ao visual. (...) Inserções em Circuitos Ideológicos se concentrava em isolar e definir o conceito de circuito, valendo-se de um sistema preexistente de circulação. Nesse sentido, as frases nas garrafas de Coca-Cola e nas cédulas funcionavam como uma espécie de graffiti móvel. Já Inserções em Circuitos Antropológicos consistia basicamente na fabricação - e na posterior circulação - de uma série de objetos que poderiam influenciar o comportamento político-social, como fichas para telefone, transporte, etc. A obra se relacionava com o circuito pelo emprego de aspectos que existiam como uma precondição do produto. (...) Com Tiradentes. . . eu estava interessado na metáfora e no deslocamento do tema. Queria usar o tema, vida e morte, como a matéria-prima do trabalho. O deslocamento é o que importa na história do objeto de arte. Mas esse trabalho contém um discurso mais explícito, direto, que é meu próprio ponto de vista. Como objeto formal, evoca memórias de auto-imolação, ou de vítimas de explosões ou de bombardeios de napalm. Havia toda a imagística da guerra na época, e eu queria fazer uma referência a isso, de modo que despertasse a atenção. A ação foi realizada num cenário deslocado, parecido com uma abertura de exposição num canteiro de obras. Claro que jamais repetiria um trabalho como Tiradentes. . . Ainda posso ouvir as pobres galinhas em minha memória psicológica. Mas em 1970 senti que aquilo tinha de ser feito. (...) Como artista profissional, o que talvez seja uma contradição, vejo o mercado como um horizonte importante. Meu trabalho sempre busca alguma espécie de comunhão com essa indefinida, ampla entidade que se chama público. Ao mesmo tempo, tem um aspecto completamente independente. A obra tem de 'parar em pé', no sentido de que precisa ter completa autonomia. Se isso não ocorrer, a idéia do trabalho desaparece. (...) Em grande parte da minha obra há uma interpenetração entre o trabalho de arte e a vida diária, e isso afeta a escolha do material. Estou interessado em materiais ambíguos, que podem simultaneamente ser símbolo e matéria-prima, assumindo status de objetos paradigmáticos. Os materiais que podem conter essa ambigüidade vão de fósforos a garrafas de Coca-Cola, de moedas a cédulas ou a uma vassoura, como em La Bruja (1979-81). Estão no mundo cotidiano, próximos de suas origens, ainda impregnados de significados. (...) Muito de minha obra se ocupa da discussão do espaço da vida humana, o que é tão amplo e vago. O espaço, em suas várias manifestações, abrange arenas psicológicas, sociais, políticas, físicas e históricas. Não importa realmente se ocorre ou não uma interação entre espaço utópico e espaço real. Acho que há um aspecto quase alquímico: você também está sendo transformado pelo que faz. Muitas dessas transformações se dão num nível oculto, sutil. (...) A maior parte de minhas obras pode ser reconstruída; não têm de ser únicas. Essa discussão era muito comum no Brasil no final dos anos 60. (...) Estávamos preocupados com a questão de como estruturar a obra de modo que pudesse ser refeita de maneira quase idêntica e escapar à aura do original". AcervosAcervo Pinacoteca do Estado de São Paulo/Brasil - São Paulo SP Exposições Individuais1967 - Salvador BA - Cildo
Meireles: desenhos, no Museu de Arte Moderna de Salvador - MAM/BA Exposições Coletivas1965 - Brasília DF - 2º Salão de Arte Moderna do Distrito Federal Fonte: Itaú Cultural Quais eram as intenções de Cildo Meireles ao criar o projeto Insercoes em circuitos ideológicos?Resposta. Resposta: As séries de inserções em circuitos ideológicos de Cildo Meireles procuraram explorar alternativas comunicacionais e artísticas para executar uma verdadeira guerrilha contra o sistema repressor da ditadura militar.
Qual era o principal objetivo de Cildo Meireles?Cildo Meireles é um artista conceitual brasileiro conhecido por seu pioneirismo na criação de instalações artísticas no país. Seus trabalhos são famosos por mostrarem engajamento político e estimularem a interação do público.
O que se trata o projeto CocaProjeto Coca-Cola: Consiste na inscrição de mensagens em vasilhames de refrigerante ainda em circulação. Entre as inscrições estão: mensagens políticas incisivas, a própria descrição do projeto e uma pequena ilustração na qual ensina como transformar a garrafa em um coquetel molotov.
Quais são as propostas de Cildo Meireles?Resposta. Resposta: sua arte baseia-se na criação de objetos e instalações que possibilitam diretamente ao espectador uma experiência sensorial completa, e que questiona, entre outros temas, a ditadura militar no Brasil e a dependência do país na economia global.
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